Um Titã no palco
Depois de con-quistar seu espaço no cinema com louvor, o titã Paulo Miklos, também ator elogiadíssimo, faz sua estreia no teatro na pele do lendário trompetista americano Chet Baker (1929-1988). Depois de críticas entusiasmadas, ele se diz encantado pelo palco – um lugar em que ele acumula bastante experiência, mas até aqui somente na música. Entre um ensaio e outro, entre um show e outro, Paulo falou sobre essa nova experiência de vida.
Por: Lilian Anazetti Pimentel
Fotos: Daniel Cancini
Já faz um tempo que Paulo Miklos vem alternando sua guitarra e sua voz nos Titãs com calhamaços de textos para decorar. No cinema, ele já foi matador de aluguel (O In-vasor) – filme que marcou sua estreia nas telenonas há 15 anos – , cantor de bar (É proibido fumar), chefão do crime (Estômago) e até Adoniran Barbosa (no curta Dá licença de contar). Atualmente, seu mais novo desafio vem sendo o teatro. Em janeiro, ele estreou em São Paulo a peça Chet Baker, Apenas um Sopro, onde interpreta o músico norte-americano num dos momentos mais conturbados de sua carreira. “Tinha uma vontade enorme de fazer teatro. Tudo tem sido surpreendente pra mim”, resume Paulo.
Irão conhecer um outro lado do artista, de um ser humano aprisionado pelas drogas e alcoolismo, que aos poucos vai perdendo a percepção do caminho que ele está tomando.
A história se passa num dia dentro do estúdio, durante a primeira sessão de gravação de Chet após uma briga de rua que lhe custou a perda dos dentes da frente. Ele está inseguro e arredio – e seus quatro companheiros de estúdio (um contrabaixista, um baterista, um pianista e uma cantora) parecem estar mais ainda. Todos foram reunidos por um produtor que, por ser amigo e admira-dor de Chet, acredita que ele está pronto para voltar à ativa. “É um espetáculo que contém muita música e drama, exatamente como a vida de Chet Baker. Um artista brilhante, um talento natural, aprisionado pela droga e pela autocomplacência. Chet é um dos meus ídolos, muitos deles morreram ainda mais jovens, nenhum sobreviveu à própria genialidade. Respira-ram música acima da vida. Viver esse músico é um grande presente que eu recebi”, comenta Paulo.
A peça tem direção de José Roberto Jardim. Com-pletam o elenco a atriz, cantora e dramaturga Anna Toledo e os atores/músicos Jonathas Joba, Piero Damiani e Ladislau Kardos.
GW: Como tem sido fazer teatro?
PM: Estou muito feliz no palco, tudo é muito intenso e o aprendizado tem sido enorme. Estava acostumado com o cinema, onde tudo é fragmentado e a gravação das cenas nem sempre segue uma sequência. No teatro a gente vive a história num fôlego só, temos a chance de repetir e trazer vida a cada sessão. Na verdade, é uma repetição, mas cada público reage de uma forma, o que torna cada apresentação diferente da outra.
GW: Você de certa forma está acostumado com o público e com o palco, afinal são mais de 30 anos no Titãs. Como encarou e como encara o nervosismo da abertura das cortinas?
PM: Sinto frio na barriga em todas as situações, mas claro que a maturidade te faz ser mais confiante. Como músico é inevitável ficar nervoso com um público de dois milhões de pessoas, como num show que fizemos em Copacabana. No te- atro não é diferente, afinal é um novo desafio. Mas sou muito disciplinado, estudei muito, me preparei bastante.
GW: Como você se preparou para esse personagem?
PM: Eu já conhecia o Chet Baker, mas a peça me proporcionou um mergulho na história de vida dele. Me baseei muito no documentário Let´s get Lost, feito por um fotógrafo que o acompanhou desde a costa oeste dos Estados Unidos até a Europa, durante o ano que acabou por ser o último de sua vida. Ela capta as últimas sessões de gravação, assim como imagens raras de concertos e entrevistas com Baker, músicos, amigos, ex-mulheres e filhos.
GW: Já precisou improvisar na peça?
PM: Até agora não, mas outro dia me peguei falando uns “cacos”. Acho que me empolguei (risos).
GW: O que as pessoas podem esperar do espetáculo?
PM: Podem esperar muita música – afinal, os cinco ato-res são músicos. Fazemos tudo de verdade, acontece ao vivo. Além disso, irão conhecer um outro lado do artista, de um ser humano aprisionado pelas drogas e alcoolismo, que aos poucos vai perdendo a percepção do caminho que ele está tomando.
GW: O que mais te surpreendeu sobre Chet Baker?
PM: O que mais me surpreendeu nele foi sua ca-pacidade técnica fenomenal, seu domínio do instrumento, sempre mantendo uma aparente simplicidade.
GW: Um momento na peça que você destaca…
PM: Tem um momento de delírio do personagem em que encaro o público e é bastante inten- so. É um trecho muito emocionante e que me possibilitou uma experiência teatral muito forte.
GW: Nesta correria da sua vida, entre shows e apresentações de teatro, qual tem sido seu prazer nas horas vagas?
PM: Ficar em casa tranquilo com a minha na-morada e com meus enteados. Esse tempo que passamos juntos é o meu descanso.
Sobre CHET BAKER
Ícone do jazz mundial, cool, cult, símbolo sexual – rótulos são insuficientes para definir Chet Baker. Filho único, mimado pela mãe e brutalizado por um pai alcoó-latra, o músico alcançou a fama muito cedo. Em 1952, aos 21 anos, era convidado a tocar com o mestre Charlie Parker. No ano seguinte, seria eleito o melhor trompetista de jazz em atividade.
Autodidata, Chet começou a tocar aos 13 anos, em Los Angeles, quando ganhou um trompete de presente do pai. Ao longo da carreira, dividiu o palco e os estúdios de gravação com gigantes do porte de Charlie Parker, Stan Getz e Gerry Mulligan. Casado três vezes, teve quatro filhos e muitas amantes, mas suas verdadeiras paixões eram a música e a heroína. O vício fez com que Chet vivesse mais de 30 anos em função da droga, desde o auge da carreira, quando sua beleza romântica fascinava multidões, até os últimos dias de vida, quando caiu do segundo andar de um hotel em Amsterdam, em 13 de maio de 1988.
Serviço
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