Toque de Midas
Ele já criou mais de 40 restaurantes e ícones da gastronomia paulistana, como o Sushi Company, a Cia Asiática e o Limone. E foi o responsável pela liberação do absinto no Brasil e no mundo. Um empresário empreendedor, criativo e inovador, que deseja com a sua mais nova casa, a Tartuferia San Paolo, fazer da trufa a mais nova paixão nacional.
Se você acompanha a cena gastronômica paulistana, certamente já ouviu falar de restaurantes como Sushi Company, Companhia Asiática, Bar Armazém Paulista, JotaKa, Limone, Mercearia Nacional, café L’Absinthe e Le Caipirinha. Pois eles fazem parte da lista de mais de 40 restaurantes, no Brasil e no exterior, criados (é exatamente este o termo) pelo irrequieto Lalo Zanini – um dos empresários brasileiros que mais inovou na área de gastronomia.
Lalo sempre foi impetuoso e aventureiro. Filho de pai médico e mãe decoradora, ele começou atuando no mundo da moda, trabalhando na iniciante Forum, de Tufi Duek. “Aprendi lá a ser um varejista, um homem de vendas, a lançar moda e a administrar o estoque. Foi uma escola”, conta. Lalo gosta de citar o slogan que, a partir dali, pautou sua vida: “Primeiro aprenda a vender, depois aprenda uma profissão”.
Foi isso que ele fez. Resolveu ir para os EUA, onde fez de tudo e foi parar num restaurante, atuando de faxineiro a gerente. Voltou para o Brasil por volta de 1996, pouco antes dos 30 anos, com muitas experiências e sede para realizar algo diferente. Com o apoio de dois amigos e um irmão, decidiu entrar no ramo de bares e restaurantes com a abertura do Club 326, na Rua Oscar Freire. A casa ia bem até que um “acidente de trabalho” mudou os rumos da sua vida. “Um dia, o chef moeu por engano uma peça de picanha e eu, para não desperdiçar, fiz um hambúrguer. O engraçado é que ficou bom e todo mundo gostou. O ‘causo’ se espalhou e os clientes passaram a pedir, a trazer amigos… Virou uma febre”, conta.
Após o episódio, a gastronomia lhe pareceu um campo aberto, apropriado para exercer seu talento em captar tendências e transformá-las em negócio. Foi assim que ele se questionou: por que só existiam restaurantes japoneses na Liberdade? A resposta foi a abertura do Sushi Company com o toque de Lalo, ou seja, um restaurante japonês com uma nova proposta, que misturava uma arquitetura moderninha, para agradar ao público dos Jardins, e um cardápio com… rodízio! O sucesso foi tamanho que o restaurante se tornou um divisor de águas, dando início a tudo que conhecemos sobre os restaurantes japoneses atuais.
O sucesso também o levou a adotar outro lema para o mundo dos negócios. “Se o investimento inicial tiver sido recuperado e se te oferecerem quatro vezes (ou mais) a receita bruta mensal, venda!”. Foi assim que ele passou a fazer o que gosta: criar sucessos, vender e criar outros. Foi assim com casas como Limone, Sprazza e Jotaka. “O Limone foi a confirmação do meu sucesso. Todo mundo queria ser meu sócio. Daí inovei também com modelos de negócios onde uma casa tinha um pool de sócios”, conta.
A partir daí, Lalo sentiu-se seguro para arriscar mais. O resultado foi a abertura de outro restaurante ícone de São Paulo: o Cia Asiática. Em um passeio pelo Itaim, ele se apaixonou por uma esquina onde funcionava um escritório de advocacia. “Bati na porta e falei para o dono, o Sr. Iko: ‘Eu quero alugar esta casa’. Depois de muita negociação, em 100 dias eu inaugurei o restaurante”, relembra. O Cia. Asiática também foi uma inovação, pois trouxe para o paulistano um mix de pratos de inspiração da “pouco conhecida” culinária asiática. Mais uma vez, ele apostou em um ambiente moderno, onde brilhava um aquário com um pequeno tubarão. Paralelamente, Lalo lançou a versão paulistana dos botecos cariocas, com o Armazém Paulista, em Moema. “O Bar Original é da mesma época. Só que eu fiz uma releitura mais paulistana e eles mais carioca”, explica.
O Absinto
Lalo tem no currículo outros “feitos inéditos”. Em um jantar com amigos, um deles mostrou uma bebida que tinha trazido de Portugal, comprado de um pequeno produtor, e que era proibida em muitos países: o absinto. Lalo pirou! Foi atrás da dona da destilaria em Portugal, fechou com ela uma parceria e deu entrada nos trâmites legais de importação para o Brasil. “A legislação exigia que tivesse uma graduação alcoólica máxima de 54%. Adequamos a fórmula de 57% para 53,5% e, em 1999, fomos o primeiro país no mundo a liberar a venda legalmente de absinto após 50 anos de proibição. Virei celebridade mundial”, conta.
O sucesso da empreitada foi o responsável pelo ressurgimento da bebida no mercado da América Latina, e posteriormente no mundo todo. E confirmou o que Lalo já sabia: ele tem faro e sabe como ninguém transformar isso em negócios concretos.
O reconhecimento veio em 2000, quando Lalo foi eleito empresário do ano pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (ABRASEL) e foi convidado para dar palestras em universidades de prestígio, como a FGV.
A partir daí, Lalo virou consultor para interessados em montar bares e restaurantes. Em uma nova sacada, ele montou o Le Caipirinha, mais uma vez com projeto moderninho de João Armentano para uma casa especializada nessa bebida bem brasileira, até então pouco explorada comercialmente.
Outros sucessos se seguiram, como o Bossa Nova, e o Virô Bistrô, em Pinheiros, que fazia um mix de culinária francesa com alta gastronomia vegetariana, onde ele conheceu sua “nova paixão”: a trufa. “Fiquei tão fascinado que fui para a Toscana entender desde quando ela crescia, como era caçada por cães treinados nos campos da Toscana, como era explorada, receitas… tudo. Fiquei obcecado”, conta.
Vale também destacar outro sucesso de Lalo quando ajudou o empresário Luiz de Morais, em 2007, a realizar seu grande sonho ao abrir as portas do Teatrix, no Jardim Paulista. O que era para ser somente um restaurante tornou-se também um pequeno teatro no segundo andar. “Me inspirei no Philippe Starck, que transformou um antigo teatro em uma casa. Eu fiz o oposto: transformei uma antiga residência, na Peixoto Gomide, em um teatro moderno, com bar e restaurante”, conta. Mais uma vez, ele usou a fórmula da arquitetura moderna, com fachada de vidro com painéis de fotos de cenas teatrais contrastando com objetos vintage e, inclusive, um belíssimo afresco, de 1934, de John Graz, artista da Semana de Arte Moderna de 1922, descoberto durante a reforma da casa.
Mas a trufa não saía da sua cabeça
Ele não resistiu e abriu com dois sócios a Tartuferia San Paolo, na Alameda Lorena, nos Jardins, no início do ano passado. Mais do que um novo restaurante, sua intenção é de ser o precursor (novamente) da trufa como a nova coqueluche da gastronomia no Brasil. No entanto, Lalo sabe que as trufas são um dos ingredientes mais nobres e caros da alta gastronomia e pouco conhecido da maioria das pessoas. Por isso, para baixar o preço dos pratos do cardápio e, consequente-mente, torná-los mais acessíveis, Lalo foi até a Itália, negociou com fornecedores e toda a logística das trufas até que elas desembarquem no Brasil. O resultado é que a casa oferece uma grande variedade de pratos e produtos, como azeites, molhos, requeijão e conservas (tem até um mini empório), à base da iguaria, deliciosos e por preços interessantes. “Nosso item mais barato é um pão de queijo com trufa, vendido a dez reais. Meus preços vão até 75 reais, bem baixos para esse produto”, afirma. Em praticamente um ano e meio, a Tartuferia fez tanto sucesso que Lalo abriu uma filial, na Rua Oscar Freire.
Não satisfeito, ele inovou mais uma vez ao ser o primeiro restauranteur a parcelar a conta no cartão. “Comecei meio na brincadeira, mas, depois do parcelamento, bati recordes de faturamento num dia”, conta. O irrequieto Lalo agora se prepara para estender essa paixão aos Estados Unidos, em especial Miami, Orlando e Nova York.“Somos os primeiros das Américas a fazer das trufas a estrela do restaurante. A ideia é levar isso para o exterior e agregá-las a itens bem brasileiros, como brigadeiro e goiabada, e coisas que eles nem imaginam, como geleias e requeijão”, afirma. Alguém duvida que ele vá conseguir?