Restaurante peruano Central conquista o título de Melhor do Mundo
É possível fazer uma matéria inteira apenas falando das peculiaridades do Central, restaurante peruano comandado com maestria pelo casal de chefs Virgilio Martínez e Pía León, e que conquistou este ano o título de Melhor Restaurante do Mundo pelo The World’s 50 Best Restaurants. O Central está no badalado bairro Barranco, em Lima. O menu-degustação tem opções com preços que superam os R$ 1.400, e todos, absolutamente todos os ingredientes utilizados nos pratos são muito característicos da América do Sul, com relevância para peixes amazônicos, batatas colhidas na altitude, grãos nativos dos Andes e diversos outros alimentos dos povos nativos. Ou seja, nada de influências francesas ou italianas, fator quase obrigatório nos muitos restaurantes estrelados do mundo todo. As cores desses originais ingredientes também chamam a atenção – e isso fica evidente nos pratos. Os peixes secos, tubérculos e raízes estão por ali em todos os formatos e naturalmente coloridos, transformando o menu em um mosaico delicioso de sabores nativos e muito originais.
Os materiais naturais estão também na entrada e no salão, com madeira e pedra evidentes. Uma mesa de mármore apresenta tais ingredientes aos clientes e isso cria uma atmosfera muito agradável aos comensais, pois ali eles têm contato com produtos que jamais tiveram proximidade e que estarão nos pratos sugeridos na sequência. Mas, como citado no início, é possível fazer uma matéria inteira sobre esses ricos detalhes do Central. Porém, queremos mais. O feito de ser eleito o melhor do mundo já diferencia o Central por si só, vamos conhecer mais sobre a concepção.
Organização Mater
Virgilio Martínez é um chef peruano reconhecido por representar e promover o Peru, sua biodiversidade e suas paisagens no cenário gastronômico mundial. Nasceu em Lima e fundou os restaurantes Central (Lima, Peru), MIL (Cuzco, Peru) e é cocriador da organização Mater. Virgilio cresceu em Lima com uma paixão pela exploração, descoberta e conhecimento. Através da cozinha, encontrou uma forma de exprimir uma curiosidade e uma criatividade sem limites que são agora os traços que o definem na perfeição da gastronomia.
Depois de ter viajado e trabalhado em cozinhas de todo o mundo, sentiu a necessidade de regressar ao Peru, ligar-se ao seu território, à sua gente e à sua cultura e criar o seu próprio restaurante e conceito. Assim começou uma nova jornada e, em 2008, nascia o Central. “Há mais por aí: quanto mais você explora, mais você aprenderá.”
Desde o início, Virgilio pensou e desenvolveu seus conceitos pesquisando e explorando. O seu mantra “lá fora há mais”, cheio de significado, ilustra perfeitamente o espírito que move a sua mente determinada e que continua a inspirar sua equipe no dia a dia. “Por detrás da ideia de ‘lá fora há mais’, existe a necessidade de investigar, de olhar para além do que sabemos, seja fisicamente, seja mentalmente. Esta é a mesma filosofia que transmito à equipa Mater nos projetos”, diz Virgilio.
Origem de tudo
Mater, criada por Virgilio e sua irmã Malena em 2013, é uma organização interdisciplinar tecida a partir de ideias compartilhadas e pessoas conectadas ao seu meio, fruto de uma interação contínua, que busca articular o conhecimento por meio da pesquisa, interpretação e expressões culturais. Nasceu como um centro de pesquisa científica com o objetivo de explorar o Peru, seus produtos, sua biodiversidade e seus ecossistemas para alimentar o conceito, a narrativa e a proposta gastronômica do Central.
Só por esses conceitos e projetos tão ricos, fica fácil entender como os chefs Pía e Virgilio, e toda a sua equipe colaborativa, chegaram ao topo mundial da gastronomia. De acordo com o conceito do projeto Mater, para que um produto artístico, utilitário ou gastronômico chegue à mesa de qualquer uma das propostas de Virgilio, ele passa por um processo de pesquisa e conceituação que busca significado e coerência, para garantir que tudo tenha um fio condutor e assim demonstre que a viagem gastronômica é muito mais nutritiva do que comer um prato excepcional num local esplêndido. Mater é a semente, a origem de tudo, fonte de conhecimento, criação e inspiração para todo esse conceito no entorno dos projetos do chef Virgilio e do restaurante Central. Daí a chave do sucesso.
O Central é reconhecido mundialmente por ser uma vitrine da biodiversidade peruana, oferecendo uma rota sensorial e visual única, projetada em torno de alturas e ecossistemas, incluindo ingredientes de -15 metros do nível do mar até 4.200 metros acima do nível do mar. O seu conceito e estética fizeram dele um dos cinco melhores restaurantes do mundo nos últimos 7 anos, de acordo com o The World’s 50 Best Restaurant Awards. “Trabalhamos muito para tornar esses ingredientes desconhecidos, como argila de chaco ou raiz de maca, tão familiares no restaurante quanto em seu habitat”, enfatiza o chef. Aqui, exclusivo para a Go Where Lifestyle, ele nos conta mais sobre a riqueza de sua gastronomia.
Você já trabalhou aqui no Brasil, o que espera da culinária brasileira no cenário sul-americano e mundial?
Em minha opinião, a culinária brasileira deveria ter um maior reconhecimento mundial, o que acredito que continuará a acontecer com o tempo, já que possuem produtos e preparações emblemáticas. O Brasil tem um imenso território que oferece uma impressionante produção de matérias-primas, uma geografia única e expressões culturais que se refletem na sua gastronomia. Grande exemplo de miscigenação e fusão natural.
Com quais ingredientes brasileiros você já trabalhou?
Praticamente, quando tocamos a Amazônia do Peru, nos conectamos muito com o Brasil, pois compartilhamos ingredientes como cacau, cupuaçu, frutas amazônicas, até raízes como a mandioca, entre outras, para citar os mais comuns, pois também existem ingredientes que têm suas complexidades e que constam em temporadas pequenas, mas que também compartilhamos muito com o Brasil. Essa conexão através de nossos produtos me faz ver que temos uma forte relação e semelhança com vocês em termos culinários.
Central foi eleito o melhor do mundo. Por que acha que ganhou esse título?
Entre muitos motivos, o que mais me destaca é a visão clara de perseguir um objetivo, um compromisso, de ter um restaurante sustentável e consistente, que funcione de acordo com os objetivos que tinha em mente, como ter um destino que cause não só um grande espaço para a gastronomia, mas também de inter-relação com outras vertentes da vida. Pode expressar a riqueza, a beleza do nosso território e também pode representar o questionamento da alta gastronomia e o seu papel na vida de todos.
A culinária peruana tem muito destaque no cenário mundial. Qual é a principal qualidade do Peru em termos de gastronomia?
Viemos de uma enorme herança agrícola. Berço da gastronomia, o Peru ocupa uma posição privilegiada que se reflete em sua sólida culinária. Essa riqueza gastronômica vem da herança transmitida por gerações em famílias, culturas, comunidades, que desenvolveram formas de trabalhar e uma visão de mundo própria, que foi alimentada com o passar do tempo e a contemporaneidade atual.
Como é o estilo de vida do chef Virgilio Martínez? O que gosta de fazer no dia a dia e quais as principais viagens gastronômicas que já fez?
Eu realmente gosto de viajar e tenho a sorte de poder explorar tanto o Peru quanto a América Latina e o mundo. Descobrir novos lugares e conhecer culturas diferentes é algo que gosto muito. Apesar do meu dia a dia ser em Lima e centrado no restaurante, viajar sempre me inspira e me motiva, pois como vivo a gastronomia com muita intensidade, encontro virtudes e aspectos interessantes em diversas expressões culinárias e refeições durante as viagens. Consumo muita gastronomia e vivo-a, o que significa que tenho uma vida muito ligada ao meu trabalho e ao meu hobby.
Por fim, qual o próximo passo para o Central?
Não temos um destino traçado, é um caminho que estamos sempre lapidando e construindo. Aspiramos sempre levar o Central para algo que continue a ligar diferentes disciplinas, e que gere emoções muito mais positivas, permitindo que a beleza seja vista de diferentes ângulos, expressando o que se vive nesta parte do mundo. Por isso, as nossas ambições para o Central serão sempre grandes, procurando constantemente superar-nos e evoluir para conseguir um espaço, independentemente do tempo.
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POR Aroldo Oliveira
FOTO DESTAQUE: Cacao Chuncho (Divulgação/Gustavo Vivanco)
FOTOS: Restaurante (Divulgação/Gustavo Vivanco), Equipe (Divulgação/Daniel Silva) e Chef (Divulgação)