Sempre na raia: um espetáculo de mulher
Ela não para! Nem mesmo quando o mundo inteiro ficou estagnado por conta da pandemia provocada pelo novo coronavírus. Muito pelo contrário: a musa Claudia Raia aproveitou essa “parada obrigatória” para criar. “Durante a pandemia, escrevi meu livro de memórias, Sempre Raia Um Novo Dia, junto com a Rosana Hermann. Isso fez com que eu mergulhasse ainda mais profundamente em mim, na minha história”, comenta a musa, que também aproveitou o tempo para curtir mais a companhia da filha, Sophia, que irá passar uma temporada de estudos no exterior. Nesse período, la Raia também aproveitou para gravar um CD com as músicas do espetáculo Conserto para Dois – junto do seu marido, Jarbas Homem de Mello – para lançar nas plataformas digitais. “Isso é algo inédito aqui no Brasil. Achamos que seria muito legal. Esse é um espetáculo 100% nacional, que encomendei para Anna Toledo, trabalhamos uns dois anos construindo o texto, as músicas. Ele merecia esse tratamento especial no nosso entendimento”, explica Claudia, que ainda revela que o Conserto para Dois – que teve suas apresentações interrompidas por conta da pandemia – volta aos palcos agora em outubro. “Nem acredito! Estou muito feliz e emocionada também com essa possibilidade de reencontrar o público quase dois anos depois.” Confira a seguir, a entrevista exclusiva que a atriz concedeu para a Go Where:
Antes de sermos acometidos por essa pandemia, sua vida profissional era extremamente agitada com gravações, espetáculos, campanhas publicitárias… E de repente parou tudo. Você já tinha feito um intervalo tão grande longe dos palcos e estúdios de gravação? Como foi esse período?
Não foi fácil. Acho que foi a primeira vez que eu respondi “não sei” quando me perguntavam as coisas. Porque não tem como prever nada mesmo. Mas isso não fez com que eu não planejasse coisas. Durante a pandemia, escrevi meu livro de memórias, Sempre Raia Um Novo Dia, junto com a Rosana Hermann. Isso fez com que eu mergulhasse ainda mais profundamente em mim, na minha história. Se tem uma coisa que a gente fez nessa pandemia foi se encarar de frente, né?! Porque era isso: a gente com a gente mesmo o tempo inteiro. Ao mesmo tempo, por causa dessa parada forçada, eu fiquei mais em casa e consegui ficar ainda mais com a Sophia, que está indo estudar fora. Em um outro momento, não viveria isso dessa maneira. Eu sempre tendo a olhar o copo meio cheio, então, prefiro focar no que deu para fazer. Agora já estamos nos preparando para voltar aos palcos, em outubro, com Conserto para Dois, uma comédia musical em que eu e Jarbas interpretamos os 12 personagens da história. Se tudo continuar como planejado, vamos estrear no dia 1º de outubro, no Teatro Procópio Ferreira.
“(…) eu não olho para trás querendo mudar o passado ou pensando muito como teria sido se eu tivesse escolhido o outro lado do caminho. Sou uma pessoa muito confortável na minha pele (…)”
Você está arrasando com os vídeos no Instagram e no Tik Tok. Essa sua presença mais forte nas redes sociais foi fruto da pandemia?
Eu já estava me aventurando nas redes sociais. Por exemplo, meu programa 50 e Tantas eu lancei em 2019, no meu IGTV, para falar sobre mulheres 50+. Eu amo me comunicar, trocar, e as redes sociais são uma ferramenta poderosa de conexão. E também de experimentação, né?! Eu adoro aprender coisa nova. Explorar o TikTok, as dancinhas, as dublagens… Tudo isso é uma diversão para mim, uma brincadeira. Na pandemia, eu estava ainda mais em casa e acabei brincando ainda mais com isso. Mas não foi algo que aconteceu por causa da pandemia. Foi um processo natural para mim.
No fim de 2020, você lançou sua biografia, Sempre Raia Um Novo Dia, e também sua fotobiografia para celebrar 35 anos de carreira. Como foi viver esse flashback para contar sua história de vida e profissional?
Foi algo que mexeu muito comigo. É impossível ser diferente, né?! Porque a gente está ali, revendo uma vida inteira, em um momento que está mais recluso, mais introspectivo, que vê o mundo passar por grandes transformações. É tudo potencializado. Sabe aquela coisa do filme que passa na nossa cabeça? Pois foi bem isso (risos). Mas foi um filme maravilhoso, tá?! Tenho muito orgulho da história que construí e do que estou vivendo e construindo agora. Foram muitas coisas pelas quais já passei, muito aprendizado. E tenho muito fôlego ainda para o que está pela frente. Porque a verdade é que eu estou só começando o meu segundo ato, amor.
O fato de ter feito o livro em plena pandemia, de abril a junho do ano passado, deve ter te ajudado a esmiuçar, com a Rosana Hermann, cada momento com mais calma, relembrando detalhes… Imagino que esse processo tenha sido uma grande terapia, certo?
Não sei se foi bem uma terapia. Digo isso porque eu estava em paz com meu passado, com minha história. Tanto que encarei escrever um livro com minhas memórias. Porque se era para escrever, tinha que contar tudo. Não dava para ser uma meia verdade ou fantasiar. Foi um processo mais de rememorar e de apreciar a minha jornada, de ser grata por tudo, de ter a chance de explicar algumas coisas para o público, que me acompanha há mais de 35 anos. Foi muito gostoso poder viver isso, poder colocar meu primeiro ato em palavras e contar com a sensibilidade da Rosana para isso.
Hoje, mais madura, consegue enxergar algumas situações que vivenciou de maneira diferente? Teria negado algum trabalho, agido de outra maneira em algum momento?
Adoro o mais madura! (risos) E como é boa a maturidade, né?! Justamente por isso, eu não olho para trás querendo mudar o passado ou pensando muito como teria sido se eu tivesse escolhido o outro lado do caminho. Sou uma pessoa muito confortável na minha pele e acho que isso faz com que eu esteja confortável tanto com os acertos quanto com os erros da minha trajetória. A gente aprende errando, corrigindo, fazendo de novo de um outro jeito (risos). Eu acho que tudo faz parte da vida!
Está sendo reprisada na Globo a novela Tititi, e o público está matando a saudade de te ver na TV. Mas e você, ao ver essa reprise, não sente saudade de gravar?
Morro de saudade das gravações. Eu adoro fazer novela, ficar imersa naquele projeto, no personagem. E estou amando rever meus trabalhos antigos. Agora está passando Tititi, ano passado, teve Sassaricando no Viva. No Globoplay, tem A Favorita, Torre de Babel… Estou aproveitando para ver tudo porque, quando está no ar, é difícil de acompanhar. São muitas cenas para gravar, texto para decorar. Mas agora estou aproveitando e vendo tudo com a família. O Jarbas morre de pena da Donatela [personagem da atriz em A Favorita]. Eu morro de rir. Espero, em breve, estar de volta a um set de gravação. Já estou escalada para um outro projeto, mas ainda não posso contar sobre ele.
Você e a Sophia dublaram personagens do filme Luca, da Disney/Pixar. Como foi trabalhar com sua filha? Como deixou de lado a “mãe coruja” para virar a colega de estúdio?
É impossível deixar de lado a mãe coruja. Achei tão bonitinho o trabalho dela, o compromisso. Ela se divertiu e eu me diverti muito porque eu amo fazer dublagem e porque eu ainda dividi esse momento com ela. Assistimos ao filme juntas e foi muito divertido.
Impossível conversar com você sem falar no movimento ageless, que aborda bastante nas redes sociais. O que precisa ser feito para mudarmos essa cultura que desvaloriza a mulher com mais de 50 anos, que acredita que somente as mais jovens são bonitas, sexies, produtivas?
É uma luta contra todo um sistema, né?! Eu tenho plena consciência disso. Mas não fujo da luta. Se as portas não estão abertas, eu dou um jeito de escancará-las. A gente tem que começar de algum lugar e é justamente isso que estou fazendo: começando. Precisamos falar das mulheres 50+, do nosso poder, da nossa potência, de como estamos no auge e de como a gente pode realizar tudo que quiser. Quero falar sobre sexualidade, menopausa, maternidade… Por que essas coisas precisam ser tabu? Por que amadurecer é um problema? Não é, gente. O problema é a gente negar isso, negar que o tempo passa. O problema é querer essa fórmula da juventude eterna, que não existe, tá?! Já pensou como seria muito mais bonito se a gente fosse ensinada a abraçar a maturidade, o passar dos anos? Como seria bom a gente poder celebrar isso em vez de querer esconder? Então, eu falo sobre isso, por mim, pelas outras mulheres ageless e pelas gerações que virão. Nós existimos e queremos ser vistas, ouvidas e representadas.
Para finalizarmos, que conselho que a Claudia de hoje daria para a Claudia de 20 anos de idade?
Confia na sua intuição e vai. Não desista do que você deseja. Nem tudo vai sair como você planejou, mas vai dar tudo certo mesmo assim.
Por Cibele Carbone
Fotos Destaque Vinícius Mochizuki