O artista plástico Luca Benites e o sucesso do projeto Fogo
Com uma personalidade tranquila e avesso a exibições, o artista Luca Benites concilia esse lado discreto e sereno com uma vida de viagens bastante movimentada. Para ele, sua quietude talvez seja uma das razões para que o seu trabalho fale mais alto. “Muitos artistas gostam e buscam, constantemente, essa ilusão e poder que a fama traz. Para mim, tudo isso é bastante vazio, e a arte só começa a fazer sentido quando gera reflexão e introspecção. Um exemplo disso é o efeito que o meu projeto Fogo gerou no público. Um pequeno ponto de inflexão ao entenderem o intuito dele, interiorizarem sua mensagem e começarem a atuar em função de um novo entendimento. É assim, por meio do meu trabalho e em função dele, que gostaria de ser visto pelo público”, desabafa o artista. Aqui, o brasiliense que impactou o mercado internacional, faz uma reflexão exclusiva a Go Where Lifestyle.
Como você enveredou pelo caminho da arte?
Comecei a pintar em 1998, com o reconhecido pintor uruguaio Ignacio Iturria, em Montevidéu. Dois anos depois entrei na faculdade de Arquitetura, onde também houve uma conjunção de temas relacionados, tais como pintura, escultura e composição em termos gerais. De lá para cá, já são quase 25 anos dedicados à arte. Sou arquiteto de formação (2006), sempre olhei as duas profissões como complementares e tenho consciência de que elas, de fato, se completam. Historicamente, sempre andaram em paralelo. Também atuei como professor de projetos na faculdade de Arquitetura do Uruguai. Fui produtor do Pavilhão do Uruguai na Bienale di Venezia (2019) e diretor da PINTA, feira de arte em Miami, entre outras atividades. Sempre fui muito polifacetado, tocando vários projetos simultâneos e concomitantes.
Entre as suas primeiras obras de destaque, qual foi a mais marcante?
O meu trabalho sempre está relacionado ao meu momento atual, enquanto muitos artistas costumam trabalhar durante anos em uma técnica, uma linguagem artística específica ou numa direção plástica determinada. Com isso, cada um de meus projetos – que pode diferir bastante dos anteriores – acaba representando aquela determinada fase. Hoje, talvez o meu trabalho mais marcante seja o NEXUS, que levou mais de dois anos para ser desenvolvido, com tecnologias muito específicas e um nível de acabamento bastante fino. Este é o material mais imponente e importante na minha carreira até o momento, além do já histórico FOGO Áustria, 2017).
Qual a importância da sua temporada fora do Brasil para o seu crescimento?
Em 2010, fui a Barcelona para fazer um mestrado em Arquitetura e, logo depois, emendei em outro em Belas Artes. Neste momento, estou transitando entre Barcelona e São Paulo. Nos últimos anos, morei em Xangai na China (2013), Miami (2016), Veneza (2019), São Paulo (2022) e por curtos períodos em outros lugares. Estas experiências me trouxeram novas visões do mundo da arte, da vida e de mim mesmo como artista. Vivenciar trabalhos de artistas do mundo inteiro, diferentes culturas, novas formas de fazer arte e diferentes linguagens poéticas e estéticas, potencializaram um olhar muito depurado.
Existe um conceito criado por você, uma identidade que passeia por suas diferentes manifestações artísticas?
Não diria que existe algo criado puramente por mim, mas de forma genuína e sincera realizei um projeto que, sem dúvida, marcou não somente a minha carreira como também alguns aspectos no panorama artístico atual em todos os lugares onde ele foi apresentado – não só no Brasil. Em 2017, realizei o projeto FOGO, que consistiu na queima total da minha produção artística em Ebnit, na Áustria. Ao todo, foram queimadas 300 obras de arte entre pinturas, fotografias e objetos, criados entre 1998 e 2016. Durante os três anos seguintes trabalhei com as cinzas destas obras, para questionar o uso do nosso tempo. Coloquei parte delas em ampulhetas de vidro, realizei pinturas sobre papel e alguns site-specifics – método que dedica uma obra ao seu local de exposição. A ideia básica era usar o meu tempo de vida materializado em trabalhos para lançar uma reflexão sobre o uso do nosso tempo nesta vida e a importância dada ao nosso dia a dia.
Quais artistas mais influenciaram o seu trabalho?
Durante muitos anos vários artistas foram marcando de certa forma o meu olhar. Hoje, posso dizer com total certeza: Donald Judd, Richard Serra e Joseph Beuys foram alguns dos artistas que mais me influenciaram.
Quais foram os principais reconhecimentos conquistados?
Embora eu nunca tenha focado em concursos, prêmios, bolsas e afins, ainda assim fui bastante premiado como arquiteto. Ganhei vários concursos nacionais (Uruguai) e internacionais. Participei de bienais de Arquitetura, ministrei workshops e cursos sobre Arte e Arquitetura. Um dos principais reconhecimentos talvez tenha sido a bolsa fullbright como melhor aluno do mestrado europeu em Belas Artes. Em 2008, também fui selecionado para uma exposição com outros 29 artistas, organizada pela Comunidade Europeia no Museu de Artes Visuais do Uruguai.
Atualmente, você está produzindo um documentário sobre a sua trajetória. Como surgiu essa ideia?
O documentário foi ideia de uma amiga e investidora, a Carol Paiffer. Ela vinha falando sobre essa possibilidade até que, certo dia, começamos a trabalhar nesse projeto. Até agora temos vários depoimentos de amigos e pessoas relacionadas à minha carreira. Entre elas, aparecem alguns profissionais ligados ao Museu Pompidou de Paris, o arquiteto espanhol mundialmente conhecido Juan Herreros e o crítico e curador francês Aurelien Le Genissel, entre outras figuras do mundo da arte. Ainda estamos desenvolvendo o documentário, e a finalização está prevista para 2023.
Como surgiu a parceria com a Dan Galeria e o que ela significa para você?
A aproximação com a Dan Galeria foi algo muito natural. Muitas vezes, um contato leva a outro e assim sucessivamente. Algumas pessoas foram fundamentais na minha carreira, Cristina Delanhesi, Carol Paiffer e Ronaldo de Almeida, que me ajudaram bastante nesse processo de aproximação e consolidação que já dura quase dois anos. A Dan é uma galeria com 50 anos de existência, onde tenho a possibilidade de estar ao lado de grandes nomes da arte contemporânea e da arte moderna nacional e internacional.
Neste momento, quais são os seus projetos?
Além do documentário sobre a minha vida e obra, há dois anos estou escrevendo um livro, chamado “Manifesto ao vazio”. Tem também algumas exposições em andamento e um projeto de longo alcance, o qual levarei alguns anos para concluir. Em breve, poderei dar mais pistas sobre ele.
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Por Kika Martins
FOTO DESTAQUE: Divulgação