Go Where – Lifestyle e Gastronomia

Arte na culinária japonesa com o chef Murakami

Atrás do balcão do Murakami – um dos restaurantes mais exclusivos de São Paulo, com apenas 12 lugares – o chef Tsuyoshi Murakami cria verdadeiras obras de arte para os sortudos clientes que recebe por dia. Neste bate-papo, Mura, como é carinhosamente conhecido, fala sobre os desafios de administrar seu negócio em plena pandemia e o que acha da popularização da comida oriental.

Você inaugurou seu restaurante em setembro de 2019 e em março de 2020 veio essa pandemia. Como está lidando com esse abre-e-fecha?
Não está sendo nada fácil. Mas também não é nada difícil quando a gente ama o que faz, tem a família junto e um time bem escolhido. Tivemos que nos reinventar, é claro, fazer o take away… Mas estamos nos virando, estamos vivos ainda, mantendo sempre a qualidade e uma operação pequena, com apenas 12 lugares. É muito diferente de estar em uma operação de como estava antes. Não é fácil, mas tenho fé nessa retomada.

A sua proposta é muito inovadora. Como a adaptou para o delivery?
Foi um grande desafio! A gente não está em nenhuma plataforma, está sendo tudo pelo WhatsApp, pelo boca a boca. Criamos para o take away um jubako [espécie de box com mais de um andar], que vai em um furoshiki, que é um pano tradicional japonês, e já fica de presente par a pessoa, que está sendo um sucesso. Mas tudo tem de ser feito com carinho.

“Não tem isso de pode, não pode. (…) Se um cliente falar que quer um sushi com goiabada, eu vou fazer. (…) Não tem mimimi, tem de fazer e encantar. Só não dá para fazer mais ou menos”

Como explica o fenômeno dos restaurantes japoneses em São Paulo, que já ultrapassaram em número as churrascarias?
Isso fica fácil responder. Primeiro porque a comida japonesa é única, não tem nada parecido. Sushi e sashimi, que é o que mais sai, o que tem de parecido? Vamos supor: kibe cru, carpaccio, tartar, poke, mas tudo tem muito tempero. Agora, sushi e sashimi não…

Você fez muito sucesso no Kinoshita. Por que resolveu dar uma guinada, partir para carreira solo e ganhar dinheiro?
Ainda não estou nem sentindo o cheiro do dinheiro… E ali na Vila Nova Conceição [bairro onde está situado o Kinoshita] foi uma fase. E como eu falo, em negócios e casamento, entre quatro paredes, ninguém sabe.

Você trabalhou em Tokyo, Barcelona, Nova York, São Paulo… Onde o cliente é mais exigente?
Eu adoro clientes com necessidades especiais e sou fera nisso aí. Mas, olha, o lance é trabalhar porque cliente é Deus. Agora, como estou em uma operação pequena, com apenas 12 lugares, é mágico. A gente arquitetou de forma que a equipe consiga enxergar todo balcão, a gente consegue entrar no coração do cliente. Cozinhar a dois metros de distância é muito único. É como se estivesse cozinhando na minha casa e pudesse “abraçar” os clientes cozinhando e levando a melhor experiência de atendimento, desde quando nosso manobrista recebe o cliente.

“Eu não sou muito apegado às coisas, você tem que cozinhar com o que tem. Mas eu adoro arroz. Mas não sei se eu adoro arroz ou mergulhar no arroz, selecionar, comprar, lavar, adoro o processo”

Você tem uma facilidade de comunicação muito grande. Por que não foi para o Masterchef?
Porque não me chamaram… Na verdade eu participei da terceira temporada e de uma maneira muito especial. Quando eu participei, o Jacquin teve de receber um prêmio em Paris, então ficou só eu, a Paola e o Fogaça. E eu tive de criar um prato, o Ebi Tamago Don, e eu mesmo fiz e tive de avaliar o meu próprio prato. Estava meio tenso, mas foi bem divertido.

Foto Daniel Cancini

Como vê o uso de cream-cheese, maionese e goiabada nos temakis, sushis. Acha que isso contribuiu para popularizar a culinária japonesa no Brasil?
Também, isso caiu no gosto do brasileiro mesmo. Quando os restaurantes japoneses começaram a sair da Liberdade para ir para os outros bairros, nos anos 90, essa influência americana contribuiu. Outra coisa que ajudou foi o lance de ter sushiman em novela, em filmes, e o fato de ter restaurante em shopping. Eu não julgo esse estilo, eu não faço no Murakami. Na cozinha, é só ter base. Não tem isso de pode, não pode. Pode tudo! Se um cliente falar que quer um sushi com goiabada, eu vou fazer. Só me avisa com antecedência para eu me preparar. Aí esse cliente vai comer o melhor sushi com goiabada! Não tem mimimi, tem de fazer e encantar. Só não dá para fazer mais ou menos.

O que não pode faltar na sua cozinha?
Eu não sou muito apegado às coisas, você tem que cozinhar com o que tem. Mas eu adoro arroz. Mas não sei se eu adoro arroz ou mergulhar no arroz, selecionar, comprar, lavar, adoro o processo. Agora, o que não pode faltar é gente com vontade de trabalhar, comprometida.

Por Norberto Busto

Fotos Daniel Cancini

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