Go Where – Lifestyle e Gastronomia

Washington Olivetto revela suas preferências e estranhezas gastronômicas

O primeiro restaurante, como os sutiãs, a gente nunca esquece. O dele foi, aos dois anos de idade, uma pizzaria na zona leste, que ainda hoje serve suas redondas a uma clientela fiel – como ele. Mas, desde esse dia, o mais festejado publicitário brasileiro nunca mais parou de se deliciar – e de fazer propaganda de suas preferências e estranhezas gastronômicas, aqui e no resto do mundo. Já escreveu dois livros de garimpagens– Só os patetas jantam mal na Disney, sobre delicias ocultas dos jantares nos parques de Orlando, e Achados e roubadas, um roteiro de prós e contras em mesas de todo o mundo. Olivetto é um arguto explorador de cozinhas.

Por: Celso Arnaldo Araujo

GW: Você se considera um gourmet?
WO: Não sou um gourmet, mas um “gurioso” – uma mistura de guloso com curioso. Gosto muito de comer. Tenho amigos que comem muito bem, como o Boni. De minha parte, descobri uma coisa: gosto de descobrir lugares, mas não frequento restaurantes; frequento pratos. Na minha infância, fui a alguns bons restaurantes, mas não a muitos, porque minha família não podia ir a restaurantes bons toda hora. Minha tia, que tinha uma vida melhor, gostava de promover eventos gastronômicos em datas especiais, sobretudo no aniversário de meu avô. Os restaurantes que me marcaram dessa época foram o La Paillote, o Ca´d´Oro e o Rodeio. Minha tia me paparicava muito e me levava também a lugares clássicos, como o Gigetto da Rua Nestor Pestana.

GW: Qual é a sua frequência em restaurantes hoje?
WO: É mais quando viajo. Estou dividindo meu tempo hoje, ostensivamente, entre São Paulo, Rio e Londres. Meus gêmeos de 13 anos vão estudar em Londres – onde dou consultoria criativa ao escritório da McCann.

GW: Mas, ficando no Brasil: no Rio, onde você come?
WO: Não em muitos lugares. Vou muito ao velho Satyricon – sempre impecável. Ao D´Amici, no Leme. Ao Margutta, de Paulinho (o italiano Paolo Neroni) e Conceição. Às sextas-feiras, o picadinho da Roberta Sudbrack, que é excepcional. Carne no Rubaiyat, também pela vista maravilhosa do Jockey Club. Como a da Bráz, que tem um espelho que reflete o Pão de Açúcar.

GW: Outro dia, você foi visto comendo na cozinha da A Casa do Porco…
WO: Tenho ido muito lá. Considero A Casa do Porco o grande fato da gastronomia brasileira nos últimos anos. Conheci o Jeffinho (Jefferson Rueda) ainda como aluno de meu queridíssimo amigo Laurent Suaudeau, o cara que mudou a cara da gastronomia no Brasil. O último jantar que o Jeffinho fez para amigos do Laurent, antes de ele ir para o Bocuse d´Or no primeiro ano do Lula, foi na minha casa. O Jeffinho sempre cozinhou muito mas, com A Casa do Porco, consagrou um projeto autoral. Aquele é o Jeffinho de São José do Rio Pardo. Mas o Jeffinho criou um problema comigo. Tudo o que ele cozinha é muito bom, mas agora que ele criou o melhor misto quente da história da humanidade, eu só como misto quente.

GW: Como assim?
WO: Ele agora serve o melhor misto quente e o melhor cachorro quente do mundo – o hot pork, servido num carrinho que simula uma barraca de foodtruck, genial. Tudo é feito lá: o pão, o pre-sunto, a salsicha, o queijo. Adoro misto quente – e o melhor do planeta, antigamente, era do Harry´s Bar de Veneza, onde aliás nasceu o Carpaccio. Eu trouxe essa ideia para o Rogerio Fasano fazer misto no Baretto – e fez grande sucesso.

GW: Mas o misto do Jeffinho é uma obra-prima. Mas A Casa do Porco também faz sucesso com cortes menos consagrados, como bochecha e até cabeça de porco. Você tem alguma restrição de paladar?
WO: Nenhuma. Como de tudo. Minha única restrição alimentar é com comida ruim.

GW: E esse hoje onipresente ovo mole?
WO: Não morro de paixão, mas como. Aliás, quem faz um ovo que eu adoro, inventado a meu pedido, é o (Tsuyoshi) Murakami. Um ovo caipira com atum que é genial. Ele compra esse ovo na Liberdade, caipirão.

GW: Você diz que gosta de conhecer lugares novos, mas frequenta pratos – não restaurantes. No fundo, você é conservador em matéria de gosto, não?
WO: A verdade é que não gosto muito das invencionices da culinária. E não tenho muita paciência para aquela coisa ritualesca e demorada do menu-degustação. Mas é preciso reconhecer tendências novas. Por exemplo: como tenho ido a Londres constantemente, constato: Londres virou um centro gastronômico. Hoje a cidade tem coisas novas notáveis.

GW: Programas gastronômicos recentes em São Paulo?
WO: Fui duas vezes ao Tanit e comi muito bem, com destaque para um Fideuá – minha receita preferida em Barcelona, um cabelinho de anjo com molho de paella e um alho e óleo para colocar em cima. Ia muito ao Kinoshita me deliciar com a sequência que o Mura fazia para mim. Mas outro dia jantei no Dô – uma revelação de restaurante japonês. A bela Sintra está vivendo um momento muito bom. Está todo equilibrado. Eu odeio gente que subverte pratos e não recomendo – não se dá palpite a chef ou cozinheiro. Mas na bela Sintra eu subverto… Eu negocio. Pego o picadinho deles, tiro a banana e negocio por mais um ovo. E troco o feijão mulatinho pelo feijão branco que ele serve com a perdiz. Fica campeão.

GW: Gosta de cozinhar?
WO: Cozinho mal pra cacete, mas faço coisas boas não porque eu saiba cozinhar – mas porque misturo um monte de coisas caras. Isso não é mérito. Meu cachorro quente é genial.

GW: Você tem fixação por cachorro quente, né?
WO: Tenho uma história engraçada em Londres. Em Covent Garden, há um trailer de cachorro quente alemão, muito bom, monumental. Eu estava lá no inverno e pensei: este cachorro quente merece um vinho bom. Perto de Covent Garden tem um restaurante Baltazar igual ao de Nova York. Fui lá, chamei o maître e perguntei: se eu tomar umas três taças do melhor tinto da casa, eu posso trazer cachorro quente aqui? O cara topou. Comi um cachorro quente com um Borgonha, em Londres, num restaurante estrelado.

GW: Qual é a tua receita do cachorro quente top?
WO: Uma baguete excepcional, uma grande salsicha artesanal, queijo ementhal ou gruyère num tamanho que dê para fazer fatias largas, mostarda Dijon ou Colman´s – dependendo de quão bravo você é. E meu filho desde os seis anos de idade pergunta se vai ter tabasco… Pegue duas lascas do queijo um pouco maior que a baguete e salsicha, ponha a mostarda, a salsicha, mais mostarda, ponha no forno. Derreteu o queijo, está pronto.

GW: Você é um gênio na arte de vender conceitos. Como você vê o atual momento da gastronomia, cheia de maneirismos, modismos, descrições?
WO: Não é minha praia. Tenho curiosidade, não vou deixar de provar. Mas, num vídeo que gravei para uma homenagem ao Laurent, eu disse que os publicitários de minha geração, que davam entrevistas e namoravam moças bonitas, hoje são chefs de cozinha no mundo inteiro. Eu, particularmente, gosto de coisas simples. Um peixe com limão e azeite. Uma bouillabaisse. Não sou de coisas hidrogenadas, reduzidas, seladas.

GW: Além do hambúrguer com seu nome no Rodeio, tem algum outro prato famoso em São Paulo batizado como Washington Olivetto?
WO: Um bacalhau do Antiquarius Rio – com ovos, cebola, alho e coentro. O hambúrguer Olivetto surgiu porque, pasmem, até os anos 80 praticamente não havia hambúrguer em São Paulo. O grande sonho do fotógrafo David Zingg era que São Paulo tivesse um burger igual ao do P.J.Clark americano – mais carisma do que qualidade, aliás. Hoje São Paulo tem bons hambúrgueres. Falam muito bem do Cabana Burger – um fenômeno.

GW: Pizzas?
WO: A média do Bráz é muito boa e a Bráz Quintal é linda. Mas tenho uma pizzaria de infância, que meu pai adorava – a Ideal, no Belenzinho (ver box ao lado). Uma das mais antigas da cidade. Tem fotografia minha na parede. Mitos da gastronomia ainda de pé? O Brás, do Jardim de Napoli, me conheceu criança – e ainda está lá. O Brás e o Ático (hoje com 90 anos e ainda em atividade) são os dois profissionais de atendimento mais antigos em atividade. Alguns dos momentos maiores de minha vida foram com o Ático. Ele me conheceu nos aniversários de meu avô no Ca´d´Oro. Quando comecei a trabalhar, dos 18 para 19 anos, minha vida mudou. Deixei de ser um garoto de classe média para ganhar um ótimo salário. Quando eu queria impressionar as moças, eu ia a esses grandes restaurantes. Levei uma menina seis anos mais velha que eu para jantar no Ca´d´Oro – e o Ático, que me conheceu criança, me chamou de “Sr. Washington”. Fiquei muito sem jeito. Dei um jeito de ir ao banheiro e, no caminho, perguntei a ele: “Ático, por que você me chamou de senhor?”. E ele: “Porque um homem que paga suas próprias contas já merece ser chamado de senhor”.

Algumas indicações de Washington

Árabe
Sou da geração Almanara, aprendi a gostar do Arábia, mas tem um árabe mais elaborado de que também gosto muito – o Miski.

Brasileiro
Mocotó e A Casa do Porco. Tordesilhas também é ótimo.

Francês
Vou pouco a francês. Por minha amizade com o Laurent e o Claude (Troisgros), concentro neles meus sabores franceses. Vou comer na escola do Laurent e nos restaurantes do Claude no Rio.

Português
A bela Sintra e a Tasca do Zé e da Maria – aliás, eu criei o nome e o logo do bigodinho da casa.

Italiana
Vou muito ao Jardim di Napoli e ao Tre Bicchieri. E, claro, ao Fasano – o trabalho que o Rogerio Fasano fez pela gastronomia brasileira é notável.

Cozinha contemporânea
Maní. Adoro o mandiopã de lá, que compro na padaria Manioca.

Frutos do mar
Tenho ido mais ao Amadeus.

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