Go Where – Lifestyle e Gastronomia

Sucesso Sob Medida

Dá para se identificar de longe um terno com a grife Ricardo Almeida – o estilo slim fit, mais junto ao corpo, é sua marca registrada. Com 21 lojas próprias (18 masculinas, três femininas), tem outras a caminho. Inúmeras celebridades, de megaempresários a Neymar, desfilam de Ricardo Almeida. Ele começou a trabalhar aos 11 anos, na Casa Almeida – tradicional loja de roupa de cama, mesa e banho, pertencente à família. Hoje com 62 anos, está no auge como estilista e empreendedor – com uma nova e moderna fábrica no Bom Retiro, de onde saem ternos, calças, camisas e sapatos para todo o Brasil. E, claro, com uma linhagem exclusiva – com fios de lã 170´s e 200´s da grife italiana Loro Piana, cujos ternos não saem por menos de 22 mil reais. Mas se a alfaiataria masculina consagrou Ricardo Almeida, agora ele vai voltar seu olhar de criação para as mulheres – com a linha For Special Ladies

Por: Celso Arnaldo Araujo

GW: Como você se conceitua? Alfaiate, estilista?
RA: Em minha área eu seria um estilista. Mas me posiciono mais como uma pessoa de criação. Porque, além das roupas, eu crio todos os projetos de nossas lojas, fábricas…

GW: E na parte gerencial? Você é bom com números?
RA: Minha formação foi em cima disso. Eu trabalhei com meu pai desde os 11 anos no Natal e, a partir dos 14, já fixo na loja. Lá eu aprendi toda essa parte burocrática. Não é o que eu gosto, mas sei fazer direito, por ter estudado a matéria. Tenho uma base matemática boa. Mas o que eu mais gosto, e o que eu vivo para fazer, é criação.

GW: Vejo você no chão de fábrica, supervisionando uma linha industrial. Mas as pessoas ainda te veem com uma fita métrica na mão, tirando medidas de megaempresários para superternos…
RA: Com hora marcada eu ainda atendo alguns clientes. Mas o preço que eu cobro evidentemente é diferente das minhas lojas. Porque se eu cobrar o mesmo preço da loja, todo cliente vai querer que eu o atenda pessoalmente. Sou eu que faço o molde, eu que faço todas as provas, eu acompanho a produção… faço tudo.

GW: Indique algumas personalidades masculinas que sejam a identidade mais forte do estilo Ricardo Almeida.
RA: O bom que eu acho de identidade é que a gente pode atender os pais e os filhos. Eu já atendi, por exemplo, o Eduardo Suplicy e o Supla, o João Doria e o Johnny Doria. Agora mesmo o Fabio Assunção foi concorrer a um prêmio lá fora e o filho dele, João, de 14 anos, fez a roupa comigo e ficou incrível. O João já passou o Fabio em altura…

GW: Qual é mesmo a diferença entre terno e costume?
RA: O terno, como o nome sugere, vem com três peças – incluindo o colete. Já o costume é sem o colete.

GW: É só bater o olho em alguém usando um Ricardo Almeida e a primeira coisa que se nota é o terno mais ajustado ao corpo. Você só faz assim?
RA: Eu posso fazer mais largo. Não que eu goste…

GW: Por quê?
RA: Porque eu acho que a pessoa fica mais alongada e mais sofisticada quando tem um corte slim fit. Ela fica mais longilínea.

GW: Isso é para estimular o cara a ficar em forma…?
RA: Não é nem para estimular, é o contrário. Se o cara malha e coloca uma roupa grande, não parece que ele está malhado. Se você reparar, toda roupa mais larga deixa a pessoa maior. As roupas em que sobra tecido são recursos das marcas para atender a um maior número de pessoas, quando pensamos em numeração. A minha tem que ser feita para deixar a pessoa do tamanho que ela é, mas ajustando as proporções e equilíbrio corporal. Tudo para fi car mais harmônico. É um jogo matemático das medidas do cliente com a minha modelagem, que revela um resultado perfeito quando a roupa está pronta. Eu estou sempre em busca da modelagem perfeita.

GW: Então é fácil perder um terno Ricardo Almeida, porque se o cara engordar um pouquinho…
RA: Eu acho que a pessoa acaba mantendo aquela medida.

GW: Relembre o seu primeiro passo na moda masculina.
RA: Foi quando fui atrás de patrocínio para uma corrida de motocicleta e arranjei emprego como representante de roupa para os lojistas. Era uma empresa de representação e tinha várias marcas do Rio de Janeiro…

GW: Sua primeira assinatura de roupa qual foi?
RA: Eu ganhava comissão pelo que vendia, só que eles repetiam sempre as mesmas coisas. Aí eu falei: posso comprar os tecidos e fazer outros modelos? E eles deixaram. Era uma fábrica de camisas. Foi assim que comecei a ir para a criação. Mais tarde, já na minha linha de criação, numa fábrica da qual eu era sócio, o meu primeiro modelo foi uma calça feminina chamada A1 (A de coleção A e 1 de modelo 1). A calça vendeu muito na época. Já tinha a minha marca. Comecei a desenhar o feminino e depois o masculino.

GW: Era uma produção mínima?
RA: Sim. Eu tinha umas seis costureiras.

GW: A marca Ricardo Almeida hoje não é um ateliê, mas uma empresa enorme, com 750 funcionários e 8.000 metros quadrados de área de produção. Poucas indústrias brasileiras têm esse espaço, esse maquinário…
RA: E a gente faz ainda sob medida. As pessoas acham que o crescimento das fábricas é para aumentar a produção. Na realidade, é para aumentar a qualidade, porque na hora em que você faz um corte no computador, não tem diferença de milímetro. É muito preciso. Então você tem uma qualidade de corte maior do que quando é artesanal. E o maquinário é todo importado. Quando você precisa dar um pouco mais de brandura embaixo, o que a costureira antes fazia à mão, agora a própria máquina faz. Quando você faz a lapela do paletó, também. O maquinário faz isso com muito mais precisão.

GW: E quantos ternos você faz pessoalmente? Uns dez por mês?
RA: Por aí. Já fiz dez por dia. É que hoje, como meu negócio se tornou muito grande, é melhor eu cuidar de uma modelagem que eu vou tirar 800 peças a fazer um molde para uma única pessoa. Então eu já faço em escala muito maior. Acabo dedicando muito mais tempo a isso. Vamos ampliar muito o feminino agora.

GW: É uns 10% da sua linha hoje?
RA: Não, hoje é 3%. Mas num prazo de quatro anos vai ser maior do que o masculino, porque nós vamos abrir 40 lojas femininas. Ricardo Almeida vai ter 30 lojas masculinas e 40 femininas.

GW: E qual vai ser o nome dessa linha feminina?
RA: A linha feminina já existe e é possível ser encontrada em três lojas, que ficam na minha flagship na Bela Cintra, no Iguatemi São Paulo e no Iguatemi Alphaville. Essa linha vem com a assinatura, ou tagline como dizemos em marcas, de “For Special Ladies”. Foi uma forma que criamos para identificar as roupas que eram feitas para as mulheres.

GW: E só 30 masculinas?
RA: Sim. No Brasil, não adianta eu encher de loja. Nos lugares que não tenho uma representatividade grande de vendas, eu prefiro ter um lojista que compra de mim e vende.

GW: Tem ideia de quantos ternos você já fez até hoje?
RA: Não sei. Eu posso dizer que talvez eu seja a pessoa que mais fez molde sob medida no mundo. Porque antigamente tinha dias em que eu atendia 14 clientes. E era eu que fazia todos os moldes. Se eu fazia 30 por semana, em um mês eram 120. Que sejam 100 – em um ano, 1200. Em 20 anos, 24 mil. Só sob medida. O alfaiate tira a medida e ele mesmo acaba fazendo a roupa. Eu tiro a medida, faço o molde e outra pessoa faz a roupa. Então eu conseguia fazer muito mais moldes.

GW: Se você for usar um terno que não seja seu, cite um.
RA: Dior, que é bem slim fit. Quando o Hedi Slimane fez essa identidade para a Dior…

GW: Você tem clientes gordos?
RA: Claro, tenho clientes com todos os biotipos. Não há preconceitos ou padrões exigidos por mim ou minha equipe. A gente faz sob medida justamente para atender de forma personalizada a cada um dos clientes. Todo homem que deseja vestir a minha marca vai sair com uma boa alfaiataria sempre.

GW: Essa parceria com os tecidos Loro Piana, que vai dar um upgrade não só em qualidade de tecido mas em preço, deveu-se a quê, exatamente?
RA: Hoje nós somos referência na Europa como uma marca forte de qualidade. Eu viajo bastante e, desde que abriu a importação de tecidos, eu fui o primeiro a trazer os tecidos importados. Eles sabem do meu trabalho aqui no Brasil e sabem que poucas marcas no mundo conseguem trabalhar com esses tecidos muito caros.

GW: Aqui, um terno seu feito com tecido Loro Piana custa R$ 22 mil. Esse preço é pela matéria-prima?
RA: Sim, porque além de a matéria-prima ser 100% natural, trata-se de uma qualidade rara de fibra, que necessita de tecnologia especial, tanto para fazer o fio como para fabricar as peças.

GW: Vale a pena para você?
RA: Vale porque eu acabo dando uma exclusividade para o cliente. É como perguntar: vale a pena tomar um Petrus? Você pode tomar um [Brunello di] Montalcino, que é muito bom também, mas não é esse superexclusivo.

GW: Já pode citar alguém que já tenha comprado um Loro Piana seu?
RA: É melhor não, porque não sei se os clientes querem que eu fale. Mas tem clientes que levaram três e até quatro.

GW: Por que você não caiu com a crise? As pessoas compram menos, mas menos pessoas compram mais?
RA: Por exemplo, se um cliente meu compra cinco ternos e usa um por dia, de segunda a sexta. Então ele usa cada terno quatro vezes por mês. Ou seja, 50 vezes em um ano. Se ele usou 150 vezes esse terno em dois anos… Você pega um terno sob medida na loja, de R$ 4 mil – eu divido por 100, sai R$ 40 por dia de uso. É menos do que lavar uma camisa. Para homem, o terno é muito prático, porque ele não precisa fi car inventando. E na hora que você divide, mesmo que o terno fosse esse de R$ 22 mil, fazendo a mesma conta, vai dar R$ 220 por uso. É o preço de você lavar um terno.

GW: Muitas marcas tiveram aporte financeiro de investidores. Você já recebeu propostas desse tipo?
RA: Recebemos duas propostas de dois grupos de fora que nós estamos estudando. Se formos fazer algum negócio, vai ser só no ano que vem, quando deixarmos a fábrica nova como eu quero. Esses dois grupos estão querendo fazer expansão lá fora. Aqui dentro eu não tenho tanto interesse, porque eu mesmo acabo fazendo.

GW: Você continuaria à frente?
RA: Sim. Eu só venderia 20%.

GW: Nelson Alvarenga, da Ellus, e Ricardo Ferreira, da Richards, estão voltando a trabalhar em suas marcas. Como você vê esse tipo de retorno?
RA: Eu acho que é importante porque quando as pessoas saem da empresa, ela perde o DNA.

GW: Sua identificação pessoal com a marca é muito forte.
RA: Sim, embora hoje, para o meu masculino, eu tenho a Flávia Roismann, meu braço direito na criação.Tem muitas coisas que eu nem olho – só compro os tecidos e faço os moldes, mas os modelos ela faz. Então posso dizer que ela passa a cuidar de todo o masculino, porque em 2018 eu vou assumir o feminino.

GW: Você levou 30 anos para assumir o feminino.
RA: A marca completará 35 anos em 2018. Fiz feminino durante apenas os dois primeiros anos, quando abri as primeiras lojas. Voltei a fazer feminino em 2012 e agora, com a nova fábrica já organizada, vou conseguir assumir toda a modelagem, assim como faço com o masculino. Com a modelagem acertada, você consegue valorizar o corpo e o modelo da peça. Esse será meu foco. Acho que a mulher executiva precisa de uma roupa mais diferenciada. Um blazer, uma camisa, uma calça bem cortada.

GW: Para combinar com o homem de terno…
RA: Não é essa a ideia. Mas andar em paralelo. A executiva vai trabalhar com aquela roupa e, se sair à noite para jantar ou ir a uma festa, ela vai estar chique.

GW: Por estar muito associado à moda masculina, as mulheres podem ter uma rejeição à sua marca?
RA: O Giorgio Armani faz masculino e feminino, o Dolce & Gabbana, Dior, Hugo Boss. Então depende de como você trabalhar…

GW: Você anda de moto, não?
RA: Só ando de moto. Eu acredito na moto. Uso Ducati, mas também tenho Buell, tenho 675 Daytona, uma RD 350, mas nesse período só andei de Ducati, porque eu era embaixador da motocicleta no Brasil.

GW: Passa o dia inteiro aqui?
RA: Chego às 6h45, passo a manhã toda aqui. É indispensável estar próximo de todo o processo produtivo, isso faz toda a diferença no resultado de meu trabalho. No período da tarde costumo ficar na loja da Bela Cintra, que é nossa flagship e onde eu atendo os clientes. Saio de lá por volta das 20h.

GW: Você é supersaudável, não bebe nada alcoólico…
RA: Não bebo, como comida superbásica e simples, de criança…

GW: Sua alimentação é alimentação restrita. Você come poucas coisas e nunca expandiu seu gosto gastronômico. Onde você vai comer em São Paulo?
RA: Eu gosto bastante do Nino Cucina, do Rodolfo De Santis. Ele faz para mim do jeito que eu gosto. Como eu conheço bastante gente de restaurante, se eu for ao Fasano, por exemplo, e pedir o ravióli de mussarela de búfala, eles fazem na hora. Eu realmente gosto de uma comida mais básica.

GW: Algum de seus cinco filhos vai seguir seus passos?
RA: Ainda não sei, pode ser que sim. Dois deles já trabalham na empresa, os dois caçulas ainda é cedo para saber.

GW: O ano 2018 está começando. Qual é a perspectiva de crescimento para este ano – seu e da economia geral?
RA: Esse ano nós vamos crescer 17%, pela minha projeção. Em 2018, eu acho que a gente cresce uns 20%.

GW: Ano de eleição, Copa do Mundo… você acha que assim mesmo?
RA: Este ano eu abri quatro lojas. Está sendo um bom momento para a imagem da marca. Você pega Neymar, o Medina do surf, o Vintage, o Alok… nós transitamos por todas as tribos. Podemos pegar tanto o meio empresarial como o meio político.

GW: Você vestiria o Bolsonaro?
RA: Não tenho nada contra ninguém. Como disse, eu atendo todo mundo que deseja vestir minha marca ou ter um serviço meu sob medida. Esse é o meu trabalho.

GW: Já vestiu o Lula. Ajudou a mudar a imagem dele?
RA: Sim, ajudei. A minha família é de formação de direita e votava no PSDB – quando o Duda Mendonça veio me contratar. Não misturo opiniões e escolhas pessoais com o meu trabalho, pensando de forma geral, digamos. Se a pessoa disser quer quer um terno meu, vou fazer bem feito. Atendo todo mundo bem e passo essa orientação para minha equipe.

GW: O Lula ainda usa terno seu?
RA: Faz tempo que não encontro com ele. Da última vez, quando nos encontramos de forma casual, ele me disse que o terno estava na mesma medida que na posse. Mas nunca mais fiz roupas para ele.

GW: Qual é a imagem da marca Ricardo Almeida hoje? Conservadora?
RA: Acho que das marcas que têm foco na alfaiataria, somos a menos conservadora. Procuro sempre rejuvenescer a marca, o homem – seja no shape, nas cores, nos padrões. Sou uma pessoa que gosta de ficar próximo dos jovens, acompanhá-los no dia a dia, nas festas. É uma forma de me manter atualizado, entender como pensam, como agem, como enxergam o mundo hoje. Isso me ajuda a enxergar os próximos passos. Outras marcas que foram fortes no passado caíram porque continuaram na mesmice. É importante renovar.

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