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O Reino de Sheherazade

Um papo fabuloso com a atrevida jornalista paraibana que se tornou uma sensação nacional. Impedida de opinar na TV, Rachel Sheherazade agora solta o verbo no super jornal da maior emissora de rádio do País, a Jovem Pan, ao lado de seu parceiro no SBT – o ícone Joseval Peixoto

Por Celso Arnaldo Araujo
Fotos Moisés Pazianotto
Styling Myrna Nascimento
Cabelo / make Paulo Renso
Ela veste Lethicia Bronstein
Anel e brincos T. Arrigoni

Shehedreazade - Go'Where Luxo

Vá ao Google e digite Sheherazade. Os registros iniciais e 95% das demais páginas relativas ao nome não se referem à lendária e milenar princesa persa que consegue evitar o sacrifício das moças do reino, inclusive o dela, ao se entregar ao rei Xariar e a ele contar histórias fascinantes todas as noites – mais precisamente, “Mil e Uma Noites”. A Sheherazade mais popular do Google é a jornalista Rachel – uma paraibana de 41 anos, casada com o corretor de imóveis Rodrigo e mãe de um casal de filhos. Essa Sheherazade não entrou para a história por contar fábulas ao rei, mas por não ter medo de contrariar soberanos, comentando fatos reais com um espírito crítico incomum na TV. Há três anos e meio na bancada do SBT Brasil, essa independência lhe trouxe problemas, recentemente. Mas agora, em sua nova tribuna, o Jornal da Manhã da Rádio Jovem Pan, a Sheherazade sem papas na língua está de volta ao reino do jornalismo político – para alegria dos súditos. E Rachel também é uma linda mulher – que aqui revela uma parte dos mistérios de suas mil e uma noites na TV e suas novas manhãs no rádio.

 

Rádio de manhã, TV à noite. Já se adaptou à sua nova agenda?

Nossas escolhas têm perdas e ganhos. Perdi um tempo de convivência com meus filhos e a rotina que eu tinha estabelecido com eles há quase quatro anos. Mas a rádio Jovem Pan me abriu um espaço de opinião, que é algo que me define como jornalista. Em contrapartida, não sou mais dona de meu tempo: acordo muito cedo e durmo muito tarde. Mas não terceirizo meu papel de mãe e sou esposa também. Enfim, tenho de me equilibrar entre esses múltiplos papéis. Na escala de prioridades, a mulher Rachel hoje fica em último lugar. Primeiro vem minha família e em seguida meu trabalho.

 

Para você, que se confessa uma noctívaga, acordar às cinco da manhã deve ser um tormento…

São dois celulares funcionando como despertador, além do marido, que é mais diurno e sempre acordou cedo. Ainda começo o dia um pouco sonolenta, o raciocínio mais lento, mas minha adaptação é uma questão de tempo.
A humanidade se adaptou a tantas diversidades…

 

Além do desafio de ancorar o maior jornal da maior emissora de rádio do país, pesou mais em sua decisão de aceitar o convite da Pan a perspectiva de voltar a emitir opiniões, depois do veto do SBT?

Sim. Embora eu tivesse sido contratada pelo SBT justamente por emitir opiniões, ao longo do tempo o jornalismo muda suas diretrizes e seu formato – e mudou o formato do SBT Brasil: os âncoras não mais emitem opiniões. Voltei a ser a âncora que apresenta as notícias. Claro que isso pesou no convite – sem contar que sou ouvinte da Pan desde o final da infância. Meu despertador matinal era o prefixo “vambora, vambora, tá na hora, vambora, vambora”. Minha avó
era ouvinte fiel da Pan e do Jornal da Manhã. Quando a gente dava trabalho para acordar, ela aumentava o volume do rádio e cantava o prefixo do jornal.

 

Foi essa avó a criadora do Sheherazade de seu nome?

Não, foi a avó paterna – professora e apaixonada por literatura. Quando leu “As Mil e Uma Noites”, ela se encantou com a história da Sheherazade, que salvou não só muitas moças do reino como o próprio reino, contando uma história interminável ao rei da Pérsia. E sugeriu a meu pai que eu fosse batizada como Sheherazade. Mas a outra avó queria Rachel, por causa da Bíblia. Meu pai não quis se indispor com a mãe e com a sogra: nasci Rachel Sheherazade.

 

Que papel teve o nome Sheherazade na história de sua vida, para o bem e para o mal?

Fui uma criança muito tímida, ninguém ouvia minha voz. Nenhum professor conseguia pronunciar esse nome e eu tinha muita vergonha de corrigir. Na hora da chamada, meu coração disparava já na letra P… E quando chegava o Rachel, a professora tropeçava no She… e não conseguia ir adiante. As crianças caíam na gargalhada. Fora as vezes em que precisei soletrar, ao longo da vida… Mas quando também li a história de Sheherazade, esse nome me causou muito orgulho, até porque minha avó me chamava de “princesa Sheherazade”. Era uma princesa que contava histórias. Ainda criança, eu já escrevia histórias…

Pouca gente sabe que você também é funcionária pública concursada…
Fiz concurso para o Poder Judiciário em 1992 e assumi o cargo em 1994, quando eu já estava na faculdade. Foi difícil conciliar. A última aula terminava meio dia – e eu tinha de bater ponto na repartição meio-dia. Nem todos os professores entendiam e me liberavam mais cedo. Um deles disse que eu tinha de escolher: o trabalho ou a universidade. Eu não podia abrir mão do trabalho, uma garantia para o futuro. Nem da faculdade. Aos trancos e barrancos, consegui terminar o curso e me manter como funcionária pública.

 

Qual foi sua primeira experiência jornalística?

Ao mesmo tempo em que fui aproveitada na assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça, passei numa seleção para repórter da TV Record.

 

A menina tímida que tinha vergonha de soletrar o nome ficou para trás?

Aquela menina tímida ainda existe, de certo modo. Mas trabalhei bem minha timidez no teatro. Eu era membro da Igreja Batista de João Pessoa, que tinha um grupo de teatro. Um amigo me puxou para cima de um palco e eu me soltei, para fingir que não sou tão tímida.

 

Sua beleza chamava a atenção?

(Pausa). Olha…nunca falaram da minha…beleza. Eu fotografava bem no vídeo e tinha presença harmônica, talvez por minha experiência no palco. Mas o mais importante era que, desde cedo, eu acreditava no que eu falava no vídeo – escrevia meus próprios textos…

 

Já era atrevida…

Os repórteres não podiam dar opinião, mas eu insistia para que pelo menos meus textos ficassem livres da ingerência dos editores. Eu já lutava para manter minha personalidade jornalística. Desde cedo quis que as pessoas vissem em mim não só a jornalista, mas meus valores, meus princípios, meu jeito de falar.

 

Da Record você foi para a Globo de João Pessoa, ainda como repórter de campo. Mas você decolou mesmo foi na filiada do SBT, não?

Sim, porque era um desafio novo: assumir a bancada do telejornal regional, o Tambaú Notícias Segunda Edição, e também o jornal do meio-dia, quase um programa de debates, com entrevistados, um âncora e um comentarista político. Quando o comentarista deixou a emissora, fiquei sozinha. Comecei a fazer comentários políticos, que não era a minha especialidade. O que mais me mobilizava era a moral política de nossos comandantes.

 

E aí o Silvio Santos te descobriu na Paraíba?

E por causa de um comentário meu sobre as prévias carnavalescas na Paraíba, o ponto alto de nosso Carnaval. Um dia antes do desfile do principal bloco de arrasto de João Pessoa, eu questionei a importância exagerada que se dava a essas manifestações, que recebe patrocínios do governo, serviços de ambulância que faltam à população no resto do ano, um forte aparato policial, etc. Bem, o vídeo com meus comentários se tornou um viral na internet. Alguém me disse: você é TT! Aprendi o que era isso: eu era Trending Topics, o assunto mais comentado no Twitter…

Entre as muitas ligações que recebi, veio um convite para ir a São Paulo conhecer a sede do SBT. Vim e passei o dia com os
diretores. No fim da tarde, veio a proposta: trabalhar em São Paulo. Deu um friozão na barriga, liguei para meu marido. Eu estaria abrindo mão de minha estabilidade e de minha família, que sempre prezei muito, por algo incerto. Mas meu marido me apoiou. E assinei.

E suas opiniões sempre foram totalmente livres?

Sim, Silvio me conferiu liberdade total de assunto e teor. Nunca fui ideologicamente tutelada por ninguém.

 

O comentário sobre o menor infrator amarrado a um poste por populares mudou tudo?

Não. Fiz comentários até mais ácidos que esse. Na verdade, foi uma questão política. Sofri ameaças pela internet, até de morte. Convocaram um rolezinho contra mim na porta do SBT. Não foi ninguém, além da polícia. Mas nossos carros hoje são blindados, não posto fotos atuais de meus filhos, tenho uma vida reclusa. Aliás, sempre fui, mas fiquei ainda mais. Só vou a um evento quando necessário. Não sou dada a festas e badalações.

 

E foi em função das ameaças que seus comentários foram suspensos?

Houve uma reunião, na qual a justificativa da empresa foi que o SBT gostaria de proteger a imagem e a segurança de seus colaboradores. O SBT colocou uma escolta à minha disposição.

 

Mas quando você lê que um subdiretor da Petrobras vai devolver 100 milhões de dólares à empresa, não dá uma coceirinha na língua?

Ah, dá. Mas eu mordo a língua… Outro dia, escapou no ar um “cala-te boca”. Sou muito transparente. O âncora de hoje não pode ser um robô programado. Mas, como boa funcionária que sou, aceito a mudança de formato – minha liberdade de expressão não é exercida apenas num jornal da TV. Posso exprimi-la num blog e agora na Jovem Pan…

 

Como foi chegar aos 40 anos?

Nenhuma crise… Meu problema com idade foi aos 18 anos. Eu tinha pavor de envelhecer e nessa época usava creme antirrugas. Eu mostrava minhas “rugas” de expressão ao meu dermatologista e implorava um creme. Ele contestava: “Mas, Rachel, essas rugas até um bebê tem quando sorri”.

Numa escala de 1 a 10, qual é seu grau de felicidade hoje?

Vamos colocar uns 9? Sempre falta alguma coisa. É preciso ter um sonho a perseguir.

 

Rachel Sheherazade no ar
SBT Brasil – 19h45
Jornal da Manhã, Rádio Jovem Pan AM (620) e FM (100.9) – 7h30

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