Go Where – Lifestyle e Gastronomia

Sem pesadelos na cozinha

O chef Erick Jacquin bota terror em suas incursões por restaurantes mal-sucedidos em Pesadelo na Cozinha – versão nacional de Kitchen Nightmares, com o também irascível Gordon Ramsay. Mas tudo ali parece roteirizado
e ensaiado – as etapas do “salvamento” da casa são rigorosamente iguais, sempre pendendo para o teatro. Mas, na vida real, existem salvadores ou planejadores de restaurantes sem câmeras por perto. Não são nada teatrais, mas suas soluções são mais realistas e mais eficientes a longo prazo. Um desses profissionais da redenção gastronômica é o chef-consultor Cássio Prados – que tem em seu currículo dezenas de trabalhos bem-sucedidos em cozinhas alheias e na área de pedagogia, com sua Cacau Gourmet Brasil, uma empresa de eventos, consultorias e cursos. Com ele, não há pesadelo – mas sonhos de olhos abertos. Ele falou a GoWhere Gastronomia.

Por: Celso Arnaldo Araujo

GW: Como você analisa o Pesadelo na cozinha com o Erick Jacquin, e o programa original, Kitchen Nightmare, com o Gordon Ramsay? Pura fantasia?
Acredito que haja muita coisa forjada, feito realmente para uma execução de script.

GW: Em suas consultorias, que tipo de erro crasso, grave mesmo, você já encontrou?
O erro mais grosseiro que encontro sempre nas minhas consultorias é a aquisição de equipamentos e utensílios antes da elaboração do cardápio. Isso torna meu trabalho mais complexo, pela necessidade de adaptar a casa à realidade inversa da operação. Outro erro comum – e grave: a falta de treinamento de equipe num restaurante já em funcionamento.

GW: Você tenta “salvar” a casa sempre, ou às vezes recomenda o fechamento puro e simples?
Depende do caso. A rede de salvação sempre está aberta nos meus trabalhos, mas como lido com sonhos e expectativas, às vezes, infelizmente, a empresa está tão falida e com uma energia organizacional tão negativa e pulverizada sobre colaboradores, sócios e até mesmo fornecedores e clientes, que em alguns casos a recomendação de um fechamento é o diagnóstico mais realista.

GW: Quais são os erros mais comuns cometidos hoje pelos novos empreendedores da gastronomia?
Querer obter retorno imediato e pular etapas hierárquicas operacionais para uma tão sonhada saúde financeira favorável. Os empreendedores de hoje devem ter consciência de que pelo menos dois anos, em média, são necessários para se atingir o ponto de equilíbrio. Para alcançar uma curva de crescimento ou um ponto de maturidade com lucros reais, o tempo médio varia entre dois a cinco anos. Por isso, a restauração se torna uma operação delicada e perigosa nestes tempos delicados em que vivemos. O ideal é que empreendedores do setor reservem no mínimo duas vezes seu investimento inicial – pelo fato de ter custos fixos iniciais bastante altos e por sua falta de credibilidade junto aos fornecedores, que requisitam pagamento à vista nesse primeiro período da casa. Isso gera no empreendedor um início de ansiedade e desilusão gradativa.

GW: Você era entusiasta da cozinha molecular. A paixão passou?
Amo que faço e a Gastronomia Molecular está inserida nessa paixão, pois sempre faço aplicações da cozinha moderna em minhas prestações de serviço. Desconstrução e releituras são tendências da cozinha contemporânea. Acho que morrerei fazendo essas aplicações, mas sempre com critérios e contextos gastronômicos.

GW: Mas a chamada “pistola gourmetizadora” não tem feito estragos nos novos restaurantes? É muita espuma e muita pretensão?
Hoje em dia, essa pistola gourmetizadora rompe todos os critérios da normalidade e transforma a gastronomia num contexto cheio de anormalidades por parte dos chefs da era #gastronomia. Sem contexto algum do clássico e do contemporâneo em termos de critérios e responsabilidade gastronômica, se prostituem e se travestem do termo gourmet, criando pratos totalmente desnecessários.

GW: O que você diz a um jovem aprendiz que passa por sua escola e já se intitula “chef de cozinha”? A partir de quando ele terá direito a esse título?
Hoje as escolas vendem uma realidade que não existe. Glamour, certamente, é consequência de muito esforço e trabalho. Para se tornar um chef de cozinha, é preciso ter uma brigada afinada, cuidar de compras de insumos, logística de operação, estoque, recursos humanos, planilhas, enfim, todo o universo de um serviço de alimentação que caracteriza um profissional antes de se tornar um chef de cozinha. Só lembrando que, nas leis trabalhistas atuais, não existe um registro de Chef de Cozinha, mas de Cozinheiro. Portanto, queridos universi-tários, lembrem-se de que se vocês cumprirem com seus deveres e obrigações que uma escola exige atualmente, vocês poderão se tornar líderes de cozinha. Busquem ser mais cozinheiros e desfoquem essa nomenclatura de chef – que, no meu entendimento, só estabelece um valor no ego e não agrega muito na profissão estabelecida.

GW: Se você fosse montar um restaurante seu em São Paulo hoje, qual seria o estilo de cozinha?
Gosto muito da cozinha moderna, mas nunca tive pretensão em montar um restaurante – até por saber o quanto é cansativo e requer dedicação fulltime do proprietário para atingir o grau de excelência desejado. Sua presença diária deve ser muito intensa, e isso exige abrir mão de família, ambiente social e amigos.

GW: Os chefs estrelas também erram?
Com certeza erram e muito, até porquê, para chegarem à perfeição de um prato bem executado, são passíveis de erros. É assim que se aprende e se aperfeiçoa.

3 EXEMPLOS DE REMODELAÇÃO BEM SUCEDIDA

1. Inserção de cardápio mais moderno com âmbito artesanal, com a finalidade de atingir um nicho maior de clientes fiéis e ativos em uma hamburgueria tradicional no Alto da Lapa.

2. Treinamento mais ostensivo numa cantina italiana para maior fidelização do cliente, agregando valor no atendimento inicial, na manutenção do serviço e na finalização do atendimento.

3. Releitura dos pratos clássicos de um restaurante de cozinha contemporânea, fazendo uso de temas focados na identidade visual do espaço e na história familiar do mesmo.

AS PRESTAÇÕES DE SERVIÇO MAIS EXPRESSIVAS DE CÁSSIO PRADOS HOJE

• Hamburgueria Tooscalooza em São Caetano do Sul
• Twelve Burguer, em São Paulo
• Família Lucco, em São Paulo
• Edô Cozinha Japonesa, Santo André
• Souk Burguer, São Paulo
• Seraphina Berrifício, São Paulo
• Massas Capisce e Restaurante
• Nonna Lilla Bistrô, São Paulo
• Duamaro Cholaterie, São Paulo

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