Go Where – Lifestyle e Gastronomia

Luiza Helena Trajano, a maior vendedora do Brasil

Ela levanta por volta das 5h30. Não dorme mais do que três ou quatro horas por noite. Faz ginástica, lê revistas, assiste novela. Conectada, obtém muitas informações pela internet, tem Instagram e Twitter. Aos 64 anos, Luiza Helena Trajano tem três filhos (Frederico, Ana Luiza e Luciana), quatro netos e pouco mais de 1,50 m de altura. Até aí, nada de extraordinário. “Sou uma pessoa supernormal, como todo mundo”, ela diz. Mas Luiza Helena Trajano é, sim, uma mulher fora do comum. Ela comanda uma rede varejista com 744 lojas e faturamento de R$ 9,6 bilhões anuais. Luiza Helena Trajano continua apostando em inovações. E numa gestão voltada às pessoas, sejam funcionários ou clientes

Por Catarina Arimatéia
Foto Wellington Nemeth

Luiza Helena Trajano - Gowhere Business

Quase 10 bilhões de faturamento em 2013, 24 mil funcionários, 744 lojas e oito centros de distribuição. Nada mal para uma loja que começou pequenina, em Franca, interior de São Paulo, com o nome de A Cristaleira, comprada em 1957 por Luiza Trajano Donato e Pelegrino José Donato, tios de Luiza. Após concurso promovido por uma rádio local, foi escolhido o novo nome do estabelecimento que vendia móveis e eletrodomésticos: Magazine Luiza – claro que uma referência à tia, não a ela. Aos 12 anos, a pequena Luiza foi trabalhar na loja como balconista. Em 1991, aos 41, chegava ao cargo de superintendente, por decisão da tia Luiza – hoje, octogenária, ainda membro do Conselho Consultivo da empresa. Uma aposta certeira. Na época, o Magazine Luiza tinha pouco mais de 30 lojas. Formada em Direito em Franca, Luiza Helena Trajano levou a empresa ao topo do ranking do varejo brasileiro ao inovar, não ter medo de mudanças e fazer uma gestão voltada para pessoas. Das grandes empresas de varejo, foi a rede que primeiro lançou a “liquidação das cinco”, realizada nos meses de janeiro, com as lojas abertas a partir das 5 horas da manhã, com milhares de clientes fazendo fila dias antes.

Em relação à gestão de pessoal, há 16 anos o Magazine Luiza está entre as melhores empresas para se trabalhar no país, de acordo com o Guia do Instituto GreatPlacetoWork. No outro lado do balcão, não é diferente. Ainda hoje, Luiza Helena Trajano faz questão de responder diretamente a clientes insatisfeitos, seja por e-mail ou telefone. O case do Magazine Luiza ultrapassou fronteiras. Em 2006, a rede foi tema de estudo da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Um pesquisador da instituição chegou a acompanhar o dia a dia de executivos e funcionários da empresa. Com Luiza, não há tempo para lamentações. Tampouco supervaloriza as dificuldades. Como não gosta de problemas, parte para resolvê-los – “minha cabeça é de solução”, diz ela, entrevistada por Go’Where
Business em seu escritório paulistano, localizado no prédio da moderna loja da Marginal Tietê.

 

Quais as principais dificuldades que você sente no varejo e o que é possível fazer para melhorar? Você tem fama de otimista…

Não sou otimista, mas o varejo vive um momento muito bom. Em vez de dificuldades, prefiro falar sobre o que é importante para nós. E o importante é que as pessoas tenham emprego, renda e crédito. Quando faltam essas três coisas, realmente fica difícil. Mas, atualmente, temos vivido um momento de pleno emprego e a renda mais do que triplicou em relação aos últimos anos. O que ainda é muito difícil no Brasil é a burocracia, além
do custo Brasil.

 

Como a burocracia atinge o varejo?

Temos de lidar com muitos documentos, muita prestação de contas para muitos órgãos, muitas normas. O Brasil é um país muito fiscalizador, e isso faz com que se burocratize. É preciso mudar o paradigma. Hoje, 1,5%
do custo das empresas está na parte operacional, para cumprir as burocracias do governo – uma quantia que poderia estar voltada para a produtividade. Por outro lado, temos de controlar a inflação. E o juro não baixou
ainda por causa dela.

 

A inflação preocupa?

O nosso setor, não. E não tenho preocupação com a inflação por dois motivos: primeiro, sei que o governo não vai deixá-la chegar a um patamar alto. Segundo, o povo também não deixa. Já vivemos com inflação
e não queremos mais isso. Nós nos acostumamos a trabalhar num país com inflação controlada. Mas é preciso ficar atento.

 

Há uma onda de pessimismo generalizado no país?

Acho que, neste momento, temos de ter outra postura. O Brasil está totalmente exposto para o mundo, a Copa do Mundo é uma realidade.
O país é grande. O fato de haver jogos em vários estados aumenta o turismo, área que, inclusive, costuma proporcionar o primeiro emprego para muita gente. Neste momento, temos de mostrar que estamos unidos, exibir nossa beleza natural, e não mostrar coisas negativas que irão prejudicar o próprio emprego. Recebemos apenas 6 milhões de turistas por ano. E por onde a Copa passa, há um aumento de turistas, posteriormente, de 30 a 40%. Como ocorreu na África do Sul, sede em 2010. Ainda sobre o pessimismo, acontece que o ano eleitoral começou um ano antes. E os anos eleitorais são muito difíceis. A Copa bateu com o ano eleitoral.

 

Há protestos por todo o país…

Sou a favor de protestos. Protesto a favor da educação, a favor do transporte. O que eu sou contra, neste momento, é a gente não mostrar o que é o Brasil. Durante os dias da Copa, uma grande parte da população mundial
estará ligada no futebol.

 

Para o varejo, um evento do porte da Copa é positivo?

Sim. Para o nosso segmento, é. Os balanços do primeiro trimestre foram muito bons. Isso é muito positivo, porque o varejo é o que mais gera emprego depois do governo. E emprego, assim como a saúde, é coisa sagrada.

 

O consumo das classes C e D tem aumentado consideravelmente. Ainda há uma boa margem de crescimento?

Com certeza. Só 54% da população tem máquina de lavar automática, pouco mais de 7% tem televisão de tela plana. O consumo está aumentando porque as pessoas não tinham muitas coisas. Muitas vezes não se
pensa no que o outro não tem.

 

O magnífico escritório de Helena Trajano, em projeto dos premiados Sérgio Athié e Ivo Wohnrath

Qual o diferencial do Magazine Luiza em relação à concorrência?

Cada um tem um DNA, um jeito de ser. O nosso DNA é investir em pessoas, na equipe, nos clientes. Tenho uma linha direta com o cliente que não foi bem atendido. Agora mesmo eu estava falando com um deles.
Atualmente, o único setor em que sou operacional é o SAC. As pessoas realmente estão em primeiro lugar. Temos uma venda assistida, diferente das vendas de autosserviço. E uma venda assistida tem de ter equipe
motivada, comprometida. Acredito que esta seja nossa grande diferença. E também tenho linha direta com a equipe, um canal aberto com o pessoal de base. Varejo é isso, varejo é rapidez.

 

E o varejo está no sangue, não é mesmo?

Desde menina.

 

Como era a menina Luiza?

Comecei a trabalhar com 12 anos porque eu queria dar presentes para as pessoas e minha mãe falou para eu ir trabalhar e comprar. Fui trabalhar e gostei. Quando me formei no colegial, fui fazer faculdade à noite
e trabalhar durante o dia. Isso me deu uma vivência muito boa. Sou de uma família que adora o que faz, o que ajuda muito. Uma família empreendedora.

 

Tem vontade de entrar para a política?

Nunca. Eu me sinto política, mas não sou partidária. Não tenho partido. Eu sou política porque ajudo o país. E tenho uma missão muito grande que é a de auxiliar a construir este Brasil, porque o país não é só dos políticos, é nosso também. Só a nossa união, do cidadão brasileiro com os políticos, ajudará a fazer um Brasil melhor.

 

Qual foi o seu momento mais difícil?

É difícil falar em dificuldade, minha cabeça é de solução. Não gosto de problemas. Então, quando há um problema, busco solucioná-lo. E, se preciso, peço ajuda. A solução aparece. Pessoalmente, meu momento mais
difícil foi quando perdi meu marido (o empresário Erasmo Fernandes Rodrigues). Foi muito de repente. Em negócios, no entanto, não há como citar um momento mais difícil. Claro, continuo tendo preocupações e medos
todos os dias, mas isso é natural.

 

Tenho uma linha direta com o cliente que não foi bem atendido.
Agora mesmo eu estava falando com um deles.
Atualmente, o único setor em que estou operacional é o SAC

 

Medos?

Tenho medo de a empresa não continuar com sua cultura, com o seu jeito de ser, já que o crescimento pode trazer mudanças. No entanto, hoje acho que nossa cultura está bem nos ossos. Mas fico atenta.

 

Sucesso é sinônimo de trabalho e talento, ou mistura dos dois?

Sucesso você não tem, você está. Eu nunca falo que tenho sucesso, digo que estou de sucesso. Assim, não há como se acomodar. Todo dia você precisar adquirir novos conhecimentos e fazer acontecer. Para isso, existe
sabedoria, existe autoridade, existe dedicação, existe renúncia.

 

E a que você teve de renunciar?

Uma mulher, quando trabalha fora o dia todo, não pode curtir os filhos do jeito que gostaria. Graças a Deus, tenho três filhos supercomprometidos. Mas acabo não tendo uma vida social normal. Só que gosto tanto do
que faço… Brinco que sou paga para me divertir. Adoro o meu trabalho. E estou em vários lugares. Por exemplo, sou vice-presidente do Conselho Diretor do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos. Voluntariamente,
vou ao Comitê uma vez por mês. Eu quero estar fazendo. Hoje, é importante não só você ter conhecimento, mas também fazer acontecer. Eu sou uma pessoa de fazer acontecer. Sou de ação, de atitude. O poder, hoje, está muito na mão de quem faz acontecer.

 

No varejo, preço baixo é fundamental?

Os preços tendem a virar cada vez mais uma commodity. O que vai diferenciar uma empresa de outra é atendimento e inovação. Lógico que o preço é um fator importante, mas vai ganhar clientes fiéis quem realizar um atendimento que encante o consumidor. Para isso, é necessário ter uma equipe alinhada com os princípios da empresa. E isso só se conquista investindo em pessoas.

 

 

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