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Cláudia Alcântara transformou uma frustração infantil na marca de beleza Cadiveu

Aos nove anos, Claudia Alcântara viveu um episódio que mudaria sua vida para sempre. No salão de beleza, o cabeleireiro sugeriu um “corte prático” para a escola – o famoso mullet popularizado pela dupla sertaneja Chitãozinho & Xororó. “Só que eles tinham cabelo lisinho e eu tinha o cabelo crespo, então não ficou harmônico. Ficou parecendo um poodle”, relembra a empreendedora, fundadora e CMO da Cadiveu, uma das principais marcas brasileiras de cosméticos capilares. Crescida no Capão Redondo, em São Paulo, Claudia desenvolveu desde cedo o espírito empreendedor. Filha de feirante, começou a trabalhar aos nove anos, não por necessidade, mas pela “vontade de fazer”. O trauma do corte mal-sucedido a motivou a aprender sozinha sobre cuidados capilares, frequentando farmácias para ler rótulos de produtos, desenvolvendo conhecimento autodidata sobre cosméticos, além de cortar os cabelos de familiares.

A apostila que mudou tudo

Em 2006, enquanto trabalhava com links patrocinados no portal Yahoo e cursava pós-graduação em cosmetologia, Claudia identificou uma oportunidade de mercado. Na época, havia muita confusão sobre nomes comerciais de produtos – “escova progressiva, escova japonesa, escova alemã, escova de chocolate” – sem que os profissionais entendessem realmente as diferenças técnicas. Com seu conhecimento autodidata e experiência em tráfego digital, ela criou uma apostila explicando os diferentes tipos de alisamentos, tratamentos e colorações. O documento em Word custava R$ 45 e era vendido online para cabeleireiros através de palavras-chave estratégicas no Google. O sucesso foi imediato. Enquanto ganhava R$ 1.800 no Yahoo, já faturava R$ 2.500 com as apostilas. “Já era um infoproduto quando poucas pessoas estavam olhando para isso”, relembra. Mas foi quando o quarto cabeleireiro perguntou se ela também vendia produtos que Claudia decidiu dar o próximo passo.

FOTO: Divulgação Cadiveu/ Filipe Godoy

Com a ajuda da mãe, Claudia criou seus primeiros produtos de forma artesanal. “Peguei cremes de hidratação que já conhecia, experimentei misturas, comprei embalagens na Rua Tabatinguera, no centro de São Paulo, e coloquei no mercado”, conta.

O nome Cadiveu surgiu de um projeto da faculdade de Desenho Industrial. Inspirado em uma tribo indígena do Mato Grosso do Sul, conhecida como guerreira e considerada os “primeiros designers brasileiros”, o nome representava a conexão com as raízes do Brasil e o uso de ingredientes naturais para autocuidado. Em 2007, com o contrato social oficializado, a Cadiveu nasceu oficialmente. Mas o diferencial estava na demanda internacional que já se manifestava desde o início. “Vendia uma média de seis produtos para o Brasil e cinco produtos internacionais”, revela Claudia. O produto era enviado via FedEx para cabeleireiros do exterior que chegavam através de palavras-chave como “brazilian cosmetics”.

FOTO: Divulgação Cadiveu/ Filipe Godoy

Expansão internacional

O momento decisivo veio em 2009, na Cosmoprof da Itália, uma das principais feiras de beleza do mundo. Através de uma parceria com a Abihpec (Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos), a Cadiveu participou do pavilhão brasileiro e conquistou 30 distribuidores internacionais. “Era o momento certo, na hora certa. Não era um mercado saturado, ainda tinha muito para crescer”, analisa Claudia. Hoje, a empresa está presente em mais de 80 países, sendo forte no mercado árabe, Itália, Coreia do Sul e Austrália, com 50% do faturamento vindo das vendas internacionais. Um caso de sucesso particular é a Coreia do Sul, onde a Cadiveu desenvolveu um produto que ondula o cabelo por três meses sem danificar os fios. “É um produto super famoso na Coreia, que desenvolvemos em parceria com a USP. Agora em setembro estamos indo para um evento lá”, destaca a empreendedora.

A trajetória não foi apenas de sucessos. Claudia admite erros importantes, como a parceria com a cantora Anitta, que resultou em prejuízos significativos. “Foi a maior venda da nossa história para o B2B, mas foi um fiasco com o consumidor”, reconhece. Segundo ela, não houve identificação do público com a proposta da linha. “A gente teve uma desconexão muito grande de quem a gente é”, reflete Claudia sobre a lição aprendida. A experiência a fez retornar às origens: testes pequenos, proximidade com o cliente e estratégias de “mais por menos”. Hoje, a empresa trabalha com duas linhas principais: a Professional, com ticket médio de R$ 89, voltada para salões e consumidor premium; e a linha Essentials, de R$ 39, presente em farmácias e perfumarias.

FOTO: Divulgação Cadiveu/ Filipe Godoy

Inovação e diferencial competitivo

O departamento de P&D da Cadiveu é estruturado com uma equipe que está na empresa há mais de 10 anos. “Para exportar, é muito complexo, porque os ingredientes que são permitidos aqui de repente não são na Arábia Saudita ou na Coreia”, explica. O processo de desenvolvimento é rigoroso: “Pegamos os principais benchmarks do mercado e nosso P&D cria 300 fórmulas até chegar na que bate os principais concorrentes”, revela. A empresa viaja para as maiores feiras de ingredientes e tem acesso aos mesmos componentes inovadores que as grandes multinacionais.

Claudia defende o “essencialismo” como diferencial da marca. “Você nunca vai ver a gente lançando um produto só por lançar. Quando temos uma consultoria, falamos sobre os quatro produtos que você precisa usar. Você não tem que ficar comprando um milhão de produtos para o seu cabelo ficar bom”, explica. A estratégia atual foca na criação de comunidades de clientes através de gamificação e eventos que promovem autoconhecimento e autoestima. “Defendemos a beleza autêntica da mulher. Se a mulher está bem por dentro, ela consegue estar bem por fora também”, afirma.

Com 100 funcionários e expectativa de crescer o faturamento em 30% em 2025, vendendo seis produtos por minuto no Brasil e no mundo, a Cadiveu se prepara para expandir o marketing internacional. “A marca tem um potencial enorme se tivéssemos um desenvolvimento de marketing nesses locais”, projeta Claudia. Para empreendedoras, seu conselho é direto: “Não faça pesquisa tradicional. Entenda comportamento, converse com as pessoas, entenda a rotina delas. As pessoas só sabem o que precisam quando têm isso na mão”, cita, lembrando Steve Jobs. Aos 45 anos, Claudia também se prepara para se tornar uma verdadeira porta-voz da Cadiveu para dar mais visibilidade à marca. “Quando as pessoas conhecem a história e quem está por trás da marca, elas entendem o propósito e criam uma identidade muito grande comigo”, conclui a empreendedora que transformou um trauma de infância em um império global de beleza.

FOTO: Divulgação

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POR Jennifer Detlinger
FOTOS: Divulgação e Divulgação Cadiveu/ Filipe Godoy

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